Supremo, Bolsonaro e o banco dos réus
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Começa nesta terça-feira (25) o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que poderá transformar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete acusados em réus por suposta participação no planejamento de um golpe de Estado em 2022, ano da eleição do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A análise da admissão ou rejeição da denúncia será feita pela 1ª Turma do STF, composta pelos ministros Alexandre de Moraes (relator), Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Flávio Dino e Luiz Fux. Caberá a eles examinar se estão presentes os elementos mínimos exigidos para o processamento da ação penal.
Os ministros deverão analisar se a denúncia preenche os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal (CPP) e se não se enquadra nas hipóteses de rejeição previstas no artigo 395 do CPP. Trata-se, em síntese, de um exame quanto às formalidades exigidas para o processamento regular de uma ação penal. O estigma que paira sobre todos os réus, independentemente do crime imputado, deve ser levado em consideração com extremo rigor nesta fase processual. No entanto, a prática demonstra que, na maioria das vezes, os magistrados apenas citam a presença dos elementos essenciais para o recebimento da denúncia e abrem prazo para a resposta à acusação.
No artigo 41 do CPP, exige-se que a denúncia descreva de forma clara e detalhada os fatos que constituem o crime, permitindo que o acusado compreenda plenamente as acusações e exerça sua defesa. Em casos que envolvem múltiplos réus, a denúncia deve individualizar as condutas de cada um.
Por outro lado, o artigo 395 do CPP estabelece que a denúncia será rejeitada caso seja inepta – ou seja, se descumprir as exigências do artigo 41, especialmente no que se refere à descrição detalhada das condutas imputadas –, ou se faltar pressuposto processual ou justa causa para o exercício da ação penal.
Os pressupostos processuais dividem-se em pressupostos de existência e de validade. Os de existência incluem: a presença das partes envolvidas, a figura do juiz investido em sua função e a acusação formalizada no processo penal. Já os de validade envolvem a competência do juiz, sua imparcialidade, a capacidade para realização dos atos processuais, a legitimidade das partes e a citação válida.
As condições da ação penal incluem: a existência de fato aparentemente criminoso, a punibilidade concreta, a legitimidade das partes e a justa causa. Para que a denúncia seja aceita, é necessário haver indícios razoáveis de autoria e materialidade dos crimes imputados ao acusado, com base em provas preliminares coletadas durante a investigação.
No caso do ex-presidente Bolsonaro, estão presentes todos os elementos para o recebimento da denúncia? A análise se concentrará na situação do ex-presidente, dada a relevância de uma acusação contra um ex-chefe de Estado.
A Procuradoria-Geral da República denunciou Bolsonaro pelos crimes de liderar organização criminosa armada (art. 2º, caput, §§2º, 3º e 4º, II, da Lei n. 12.850/2013), tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do CP), golpe de Estado (art. 359-M do CP), dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, causando prejuízo significativo (art. 163, parágrafo único, I, III e IV, do CP), e deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I, da Lei n. 9.605/1998), com base nas regras de concurso de pessoas (art. 29, caput, do CP) e concurso material (art. 69, caput, do CP).
A denúncia, com 272 páginas, detalha as condutas imputadas a cada acusado. No caso de Bolsonaro, a peça ministerial vincula os fatos às provas colhidas durante a investigação, incluindo a colaboração premiada de Mauro Cid. A narrativa cumpre os requisitos do artigo 41 do CPP, descrevendo de forma detalhada as imputações. Além disso, não há, nesta fase processual, qualquer elemento que justifique a rejeição da denúncia com base no artigo 395 do CPP.
Em outras palavras, a denúncia preenche os requisitos formais para ser recebida, permitindo o regular processamento da ação penal. No entanto, isso não significa que haja provas definitivas contra o ex-presidente. Assim, a culpabilidade de Bolsonaro só poderá ser confirmada ao final do processo, com a observância do devido processo legal, direito fundamental garantido a todos os brasileiros, independentemente de suas convicções políticas.
*Marcelo Aith é advogado criminalista. Doutorando Estado de Derecho y Gobernanza Global pela Universidad de Salamanca – ESP. Mestre em Direito Penal pela PUC-SP. Latin Legum Magister (LL.M) em Direito Penal Econômico pelo Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisa – IDP. Especialista em Blanqueo de Capitales pela Universidad de Salamanca.
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