O jogador da seleção brasileira Daniel Alves foi preso

preventivamente acusado de assédio sexual em uma casa noturna em Barcelona, na Espanha. O atleta de 39 anos deve permanecer detido até que ocorra o julgamento do caso, ainda sem data definida. Especialista em Direito Penal, o professor de Direito do Centro Universitário de Brasília (CEUB) Víctor Quintiere explica as diferenças entre a legislação espanhola e a brasileira:

Há alguma diferença nas investigações sobre estupro e tipos de penalidades entre o Brasil e a Espanha? Se confirmar a autoria do estupro, configuraria qual tipo de crime? Quais as consequências?
VQ: Tanto no sistema brasileiro como no espanhol será necessária a coleta de elementos aptos a gerar, ou não, a condenação do jogador de futebol Daniel Alves. Em ambos os países vigora, até que se prove e a respectiva condenação transite em julgado, o princípio da presunção de inocência. Na Espanha, estamos diante do delito de agressão sexual, tratando-se de um conceito amplo no código de justiça espanhol.

Em síntese, agressão sexual se refere a todos os atos “que atentem contra a liberdade sexual de outra pessoa sem o seu consentimento”. A depender do nível de gravidade, as penas variam de 1 a 15 anos de prisão. O termo ganhou esta amplitude no ano passado, quando uma lei apelidada de “Só sim é sim” deu maior abrangência do crime de agressão sexual. A partir de então, todos os atos sexuais não consensuais passaram a ser considerados violência.

A mudança teve como objetivo acabar com a diferença entre abuso e agressão sexual, até então duas categorias distintas de crimes, mas com tipificações mais pesadas no segundo caso. A ideia por trás disso é a de que a ausência de consentimento da vítima é o elemento central para a definição da natureza do crime. Por isso, dos atos sem o uso de violência física ou até a penetração forçada, caso mais extremo e do qual Daniel Alves é acusado, todos são tratados como agressão sexual pela Justiça espanhola.

Neste último caso, a pena pode ser de 4 a 12 anos, com a possibilidade de chegar a 15 anos, caso sejam detectadas agravantes estabelecidas pelo código penal espanhol, como participação de mais de uma pessoa, uso de armas, ou a vítima se encontrar em estado de vulnerabilidade devido à idade, enfermidade ou incapacidade física, entre outros.

Em relação ao cenário no Brasil, conforme apontam os fatos, Daniel Alves teria cometido o que está previsto no Código Penal, no art. 215-A, do CP, consistindo no crime de importunação sexual, pois, em tese, teria colocado a mão por baixo da roupa intima da mulher numa boate em Barcelona. Com os elementos complementares envolvendo ameaças e violência em tese praticadas pelo investigado, a situação passou a englobar o delito de estupro. No Brasil, esse delito encontra previsão legal no art. 213, do CP, caput, cuja pena é de 2 a 10 anos de reclusão, em se tratando de vítima não vulnerável. Caso, em outra vertente, após os devidos trâmites, a vítima fosse considerada, no Brasil, vulnerável, o jogador responderia pelo delito do art. 217-A, §1º , do CP, cuja reprimenda seria de 8 a 15 anos.

Vale destacar ao menos uma diferença entre os mecanismos de prisão provisória existentes: enquanto na Espanha, a prisão preventiva como a do presente caso pode durar até 4 anos, no Brasil, não há prazo impositivo de duração.

O jogador cumpriria pena no país do ocorrido? Ele poderia ser extraditado para o Brasil ? A legislação seria diferente nesse caso?
VQ: No caso analisado, o jogador cumpriria pena no país onde ocorreu o delito. A resposta não encontra amparo na territorialidade, pois o fato não foi cometido no território nacional, conforme prevê o art. 5º do Código Penal. Trata-se de hipótese da chamada extraterritorialidade, trazida pelo art. 7º, do CP. Entende-se por extraterritorialidade as excepcionais hipóteses de aplicação da lei penal brasileira a fatos ocorridos fora do território nacional

Caso Daniel Alves: a legislação do Brasil e da Espanha

Caso Daniel Alves: a legislação do Brasil e da Espanha

O que pode acarretar as divergências entre os depoimentos? Durante o primeiro ele negou reconhecer a vítima. No segundo ele alegou ter tido relações sexuais de modo consensual.
VQ: Uma série de fatores podem ter feito com que tivesse ocorrido divergências entre o primeiro e segundo depoimentos, como por exemplo falhas na memória, nervosismo em relação à situação, entre outros. Tanto no sistema jurídico espanhol, como no brasileiro, a palavra dada pelo acusado na fase instrutória possui maior relevância do que aquela ocorrida na fase de inquérito policial. Por isso, é importante aguardarmos o andar das investigações, diligências, acareações e demais etapas procedimentais para, ao final do referido processo, seja possível concluirmos, com responsabilidade, acerca da condenação ou não de Daniel Alves pelos delitos imputados.

Indenização e outras penalidades alternativas podem ser aplicadas nestes casos?
VQ: A vítima poderá buscar a tutela estatal, não apenas na seara penal, como na seara cível, momento no qual será cabível a discussão de indenização por danos morais, por exemplo.

Quais as provas determinantes para concluir uma investigação como esta?
VQ: Em casos como esses, nos quais há uma dificuldade de prova, a palavra da vítima deve ser analisada com demais elementos existentes, como versão do acusado, eventuais filmagens e testemunhas.

 

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