Sem fechar um acordo de delação premiada, o ex-ministro Antônio Palocci fez uma série de confissões nesta quarta-feira para detalhar o que chamou de ???pacto de sangue??? entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o empresário Emilio Odebrecht. As revelações foram feitas na ação penal em que o ex-ministro é acusado de operar repasses de propina da Odebrecht para a compra de um prédio para o Instituto Lula e para a aquisição de um apartamento usado pelo ex-presidente.
Em quase duas horas de depoimento, Palocci não só se incriminou e assumiu todos os crimes de que era acusado no processo, como também confirmou a participação de Lula nas negociatas. A confissão de Palocci complica a situação de Lula, porque um depoimento sem delação premiada tem maior peso jurídico do que um testemunho prestado após acordo de delação premiada, sem considerar eventuais provas apresentadas. E Palocci apresentou explicações para os pagamentos de propina que não eram detalhadas na denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal.
Preso desde setembro do ano passado, o ex-ministro não tinha admitido nenhum crime em outro processo no qual foi condenado pelo juiz Sérgio Moro a 12 anos de prisão. Mas mudou de estratégia. Em casos de confissão, a legislação permite que a pena do réu seja diminuída em até dois terços, o que aliviaria o tempo total de prisão de Palocci. Justamente por isso, Lula e seus advogados distribuíram notas em que desmereceram as acusações de Palocci e alegaram que são versões desprovidas de provas.
A confissão de Palocci é mais um golpe na delicada situação jurídica de Lula. Na terça-feira, Lula, Palocci, a ex-presidente Dilma Rousseff e outros petistas de alto escalão foram denunciados no Supremo Tribunal Federal por integrar organização criminosa ??? Lula foi acusado de ser o chefe do PT na organização criminosa que desviou recursos públicos da Petrobras e de outros órgãos públicos. Também nesta quarta-feira, Lula e Dilma foram denunciados por obstrução de Justiça pela tentativa de nomeação do ex-presidente ao ministério de Dilma para que ele deixasse de ser julgado pelo juiz federal Sérgio Moro. Agora, o depoimento de Palocci, ex-ministro da Fazenda de Lula e ex-ministro da Casa Civil de Dilma, complica ainda mais a situação dos ex-presidentes e indica mais dificuldades para Lula e Dilma nos processos do STF.
No longo testemunho prestado a Moro, Palocci procurou detalhar situações mesmo sem ser perguntado. Ele disse que, durante o governo Lula, as relações da Odebrecht com o ex-presidente e o PT sempre foram no ???fio do bigode???. Mas que, em 2010, com a candidatura de Dilma os donos da empreiteira ficaram preocupados pelo risco de perder o favorecimento em contratos públicos e aceleraram a retribuição de favores ao ex-presidente. Isso porque Dilma tinha liderado o processo que tirou a Odebrecht da construção de uma das usinas hidrelétricas do rio Madeira e essa medida fez a empreiteira desconfiar que a situação não seria tão fácil em um governo dela, de acordo com Palocci. O ex-ministro afirmou que, nesse momento, Emílio Odebrecht, o patriarca da empreiteira, fez uma ???espécie de pacto de sangue??? com o ex-presidente Lula.
???Quando Dilma foi tomar posse, a empresa entrou num certo pânico e foi nesse momento que o doutor Emílio Odebrecht fez uma espécie de pacto de sangue com o presidente Lula???, afirmou Palocci.
Ele disse que, com essa preocupação, a empreiteira priorizou para Lula um pacote de propinas ??? o sítio de Atibaia, o apartamento de São Bernardo e a futura sede do Instituto Lula. ???Também disse ao Lula que tinha à disposição dele R$ 300 milhões para fazer suas atividades???, afirmou Palocci. ???No dia seguinte, Lula me chama no Palácio do Alvorada e me conta dessa reunião???, acrescentou.
Palocci não diz a data exata dessas reuniões, mas foi tão detalhista que deu credibilidade às revelações. Para um procurador da república que acompanha o processo, Palocci deu o ???bê-á-bá da corrupção???. ???Ele deu um belo relato de como os cargos eram ocupados e como a propina era paga a partir dos contratos???, afirmou o procurador.