‘Sob nuvens elétricas’ é um filme que, ambientado em 2017, um século após a Revolução Bolchevique, mostra uma Rússia que não aparecerá na Copa do Mundo. O diretor Alexey German Jr. conta a história de diversos personagens que apresentam facetas de um império esfacelado.
A grande metáfora é a de um prédio inacabado cujo arquiteto tenta inutilmente dar fim à própria vida. ?? criada uma galeria de seres perdidos em si mesmos e perante o mundo. O fato de o projeto do edifício ser diversas vezes retomado ao longo do filme reforça as discussões sobre o sentido da arquitetura, da arte e da vida numa sociedade em escombros.
Há, por exemplo, o imigrante que não fala russo e não consegue sequer consertar um aparelho eletrônico e o acadêmico poliglota que precisa trabalhar como guia turístico e pede dinheiro emprestado para comprar um laptop. Essa relação entre capacidades intelectuais e demandas tecnológicas é onipresente, num mundo em que a droga e a morte rondam.
A justaposição de dores que o diretor mostra constitui fragmentos de um todo estilhaçado, em que as fronteiras entre viver e morrer, e entre criar e ser levado pelos acontecimentos, adquirem nuanças indefiníveis. Os vivos parecem estar mortos e alguns mortos estão muito presentes, como Lenin e Stalin. Para ver, rever e pensar (muito)!
Oscar D’Ambrosio, mestre em Artes Visuais, doutor em Educação, Arte e História da Cultura, é gerente de Comunicação e Marketing da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.