do Conjur- Uma ação por tudo inusitada teve um desfecho favorável a uma moradora de Americana, que se apresenta como “pessoa comprometida com as causas de proteção de animais domésticos e silvestres”. Um juiz da 3ª Vara Cível da Comarca da cidade, em decisão proferida no último dia 30 de novembro, concedeu a ela a guarda de uma gambá fêmea, apelidada de Catarina, da espécie didelphis albiventris, cuja mãe havia sido morta, deixando a filhote órfã.

Mas, ao contrário do que se pode supor, de acordo com o magistrado Márcio Roberto Alexandre, não foi aberto um “precedente perigoso”. Pelo contrário, pois, segundo ele, após “criteriosa análise” da questão, foi definido qual “o procedimento que melhor atende ao bem estar do animal, no caso, órfão e com problemas de locomoção”.

A saga de Catarina teve início no final de março de 2019, quando o animal tinha apenas 7 centímetros. A pedido de uma veterinária, conforme narra a ação de 277 páginas, a autora da ação passou a cuidar do animal, cuja mãe foi morta, com a orientação de um biólogo especializado.

A ação, apresentada pela advogada Erika Camargo Vegners, discorre sobre os cuidados prestados ao animal, “que cresceu e ganhou peso, vindo a se tornar forte e sadia”.” Ainda é salientado que a autoria se afeiçoou à gambá. No entanto, “passado o período crítico e tendo observado que a gambá possuía dificuldades de locomoção, entendeu que ela não sobreviveria se reintegrada à natureza; decidiu, então, ficar com o animal e objetivando regularizar formalmente a sua guarda, procurou espontaneamente a Polícia Ambiental, em Americana — SP”.

A Polícia Ambiental a orientou a prestar documentos médicos relacionados ao animal para que pudesse ter a guarda de Catarina. Contudo, ao voltar com os documentos, “sem qualquer justificativa, guarda da gambá não lhe foi concedida”. Teve que entregá-la voluntariamente às autoridades.

Catarina foi enviada ao Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), em Barueri (SP), que atualmente conta com cerca de 900 animais da mesma espécie confinados sob seus cuidados.

A solução foi recorrer à Justiça. Mas a defesa do Estado de São Paulo argumentou que a autora da ação na se enquadra nas possibilidades legais autoridades da guarda de animal silvestre, e que, em caso de soltura, o animal deveria ser encaminhado para um criadouro ou zoológico.

O juiz Márcio Roberto Alexandre, no entanto, entendeu que “o presente caso se amolda como a mão à luva, à teoria do fato consumado”. Em sua decisão, afirma: “a autora possui a gambá praticamente desde que essa nasceu, e a ela vem dedicando os cuidados necessários”.

“A expectativa de vida do animal dessa espécie fora de seu habitat natural, é de cerca de 3 anos, sendo certo que, em breve, a gambá completará tal idade, sendo forçoso concluir, destarte, que infelizmente o seu passamento não está tão distante.”

Assim, conclui o magistrado, a retirada da guarda do animal da autora, com determinação para o seu retorno ao Cetas, em realidade, infligirá um maior sofrimento à gambá, “que por toda a vida esteve recebendo os cuidados da requerente”.

“Nesse passo, forte nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, há de ser mantida a guarda do animal em favor da autora. Sob outro enfoque, despontou evidente que a autora não pretendeu infringir a legislação ambiental, tanto que tentou regularizar a posse do animal, sem êxito contudo. E nem tampouco pretendia exercer o comércio ilegal do animal.”

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