Desde a previsível chegada do SARS-CoV-2 ao Brasil, há poucos dias, o vírus conhecido como Novo Coronavírus, a doença por ele causada: “Covid-19” ou “Doença por Coronavírus 2019”, e as suas inevitáveis consequências clinicas, sociais e econômicas, estão ganhando a atenção da população. E há um justificável sentimento de apreensão, por parte de quem acompanhou notícias sobre a doença, desde que ela era apenas uma epidemia, no outro lado do globo.
Diante da provável crise, a reação dos governos mostrou Ministério da Saúde e Estados atuando de forma sincronizada, na medida do possível, defronte tanto das particularidades regionais, quanto do desafio assistencial, logístico e econômico que está por vir. Ministério, Secretarias e alguns bons quadros do Executivo buscaram, simultaneamente; por um lado, preparar a enorme estrutura para suporte e tratamento que será necessária – a toque de caixa e sem contar com apoio pleno de indústrias em outros países; e por outro, evitar que as populações sejam, desnecessariamente, submetidas a uma situação de estresse, frente à realidade tão complexa como potencialmente perigosa. E, na impossibilidade de dispormos de recursos econômicos e condições estruturais para idealizar soluções com instrumentalização ainda maior, essa, parece mesmo ser a estratégia mais inteligente a seguir.
A CRISE. Na previsão de disseminação do vírus pelo país, é esperado que uma parcela de até 60% população poderá se contaminar em poucas semanas. E nesse grande grupo, apenas uma em cada 10 pessoas ficará doente, exigindo terapias especializadas. O risco de morte e a necessidade de tratamento intensivo será exigida por um grupo ainda menor, formado por 6% das pessoas que forem infectadas. Contudo, diante da quantidade de atendimentos intensivos necessária para oferecer auxílio à essa “pequena” fração da população (milhões!), a concentração da exigência de suporte médico, em um curto período de tempo, irá sobrecarregar os sistemas de atendimento à Saúde, público e privado, disponíveis no país. Ou seja, o desafio não é a gravidade da Covid-19, tampouco tratá-la adequadamente. Mas sim, dispor de estrutura específica para tratar um número enorme de pessoas com a doença, simultaneamente.
Diante da impossibilidade de evitar, de forma eficaz, que as pessoas sejam infectadas (como ocorre com outras doenças, através de vacinas, por exemplo), os esforços do governo e da sociedade, precisam ser direcionados para desacelerar a disseminação do vírus, de modo que o número de pessoas que necessitem de atendimento clínico seja distribuído ao longo do tempo, em vez concentrar-se, ocasionando picos de ocupação nas UTIs. E, na prática, as próximas semanas exigirão atenção, comprometimento e solidariedade das populações nos principais aglomerados urbanos do Brasil.
Evitar essa urgência de cuidados, sem histeria coletiva e comorbidades, irá submeter a população à experiência de rever os seus hábitos mais comuns, como por exemplo: lavar às mãos, interagir fisicamente com pessoas e objetos, frequentar e comportar-se em locais públicos, tais como supermercados, bares, cinemas, praias, lojas, etc. E diante do longo período em que será necessário evitar a progressão do contágio, objetivando a desconcentração do atendimento intensivo, medidas afoitas como estocar alimentos, isolamento, paralizações generalizadas, entre outras, revelar-se-ão pouco eficazes. Pois não serão economicamente e socialmente viáveis, por muitos dias. E a resolução da pandemia do Novo Coronavírus exigirá prazo bem mais amplo.
No intervalo necessário para a solução da crise, a capacidade coletiva de adaptação e superação da adversidade clínica, social e emocional, que podemos denominar “resiliência”, será colocada à prova. E aprimorada a cada momento, em que ações individuais e grupais forem reavaliadas, as necessidades sociais: compreendidas e, finalmente, existam mudanças de atitudes. Da melhoria na higiene que ser exigida para a manipulação de objetos do dia a dia (talheres, copos, maquininhas de cartão, elevadores, veículos públicos, etc.), às ações preventivas que todos terão que aprender a praticar, para não oferecer riscos aos outros. Por exemplo, não frequentar ambientes sociais quando apresentar sintomas, ou houver um familiar gripado, em casa. Será uma experiência e tanto, e a partir da qual, possivelmente a sociedade brasileira começará a ser reconstruída, inclusive em suas relações humanas, recentemente tão cindidas.