O luto da pandemia da covid-19 não é como o luto propriamente dito que se conhecia até então. Na verdade, as pessoas ainda estão buscando entender do que se trata toda essa dor e, de certa forma, como tratá-la melhor. Mortes em massa correspondem a lutos de dimensões traumáticas e coletivas, porém vividos nos universos particulares, individuais, subjetivos, com os indivíduos sendo afetados por perdas múltiplas e avassaladoras nas histórias de seus vínculos.
O tema é abordado no livro ‘Luto e saúde mental na pandemia da covid-19 – Cuidados e reflexões’, lançado pela Sinopsys Editora e organizado pelos profissionais da saúde mental Erika Rafaella Pallottino, Maria Julia Kovács, Daniela Aceti e Henrique Gonçalves Ribeiro. O documento faz uma reflexão sobre o impacto da pandemia em quatro cenários sociais específicos: o luto, a construção social da morte, a saúde mental e a assistência institucional.
Direcionada a profissionais da saúde (psicólogos, médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e todos que lidam com cuidados de covid e pós-covid), bem como historiadores, antropólogos e demais interessados no tema, a obra tem como objetivos provocar o conhecimento desses profissionais e incitá-los a estudarem sobre as particularidades da covid-19 relacionadas a saúde mental, luto e morte. Passados dois anos, e agora com a vacinação, a reflexão que fica é: o que se aprendeu com a pandemia?
EIXOS TEMÁTICOS
Os eixos temáticos estão sensível e organicamente expressos nos capítulos. A parte do diálogo espiritualidade e luto abre o campo para reflexões acerca da experiência de crianças e adolescentes enlutados. Trata-se de um segmento populacional marcadamente afetado em razão da morte de um ou de ambos os progenitores e que vive as consequências críticas do afastamento social pela suspensão das atividades escolares presenciais. Portanto cuidar do luto do público infantojuvenil é cuidar da saúde mental de uma geração que não crescerá sob a égide da base segura propiciada pelo sistema familiar intacto.
A construção social da morte e do morrer, que também se diferencia em tempos de pandemia, apresenta o que historicamente sustenta práticas e crenças, percorrendo vertentes atuais, com restrições que, ainda que justificadas pelos cuidados sanitários, não perdem valência para a construção de significados. O conceito de morte com dignidade é convocado, então, para se atualizar, com o imperativo de considerar o que é viver com dignidade.
Por sua vez, a saúde mental, como fundamento e fio condutor, está presente em todos os capítulos, porém é especificada no endereçamento a questões relativas a crianças, adolescentes e idosos. Destaca-se o fato de eles representarem uma condição de vulnerabilidade. Além disso, foca-se nas vivências de trauma dessa população quanto ao que lhe é específico.
Por fim, com o olhar para a ação profissional, sensível a essa realidade nova e assustadora, os profissionais se defrontam com a abertura de caminhos, a retomada de direções e os questionamentos éticos sobre a extensão da oferta de cuidados. A atenção quanto à qualidade do cuidado abrange campos de atuação em diferentes âmbitos da psicologia da saúde, da saúde mental, da atenção básica e de quadros específicos (como a oncologia), em uma resposta inteligente e necessária, levando à necessidade de se reformular os modelos assistenciais.
SOBRE OS ORGANIZADORES
A psicóloga clínica Erika Rafaella Pallottino é mestre em psicologia clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio); especialista em psicologia médica pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ); especialista em psicologia oncológica pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA); certificada no nível dois em luto complicado pela Columbia University School of Social Work; sócia-fundadora do Instituto Entrelaços; coordenadora do Ambulatório de Intervenções e Suporte ao Luto; coordenadora da pós-graduação em psico-oncologia e do curso de extensão em tanatologia, ambos pela PUC-Rio; e professora do Instituto Paliar e do Instituto de Ensino e Pesquisa Albert Einstein.
A professora Maria Julia Kovács é livre docente sênior do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP); membra fundadora do Laboratório de Estudos sobre a Morte; membra do Comitê de Ética da Academia Nacional de Cuidados Paliativos e autora do livro ‘Educação para a morte: quebrando paradigmas’.
A psicóloga Daniela Aceti é mestre em ciências da saúde e especialista em psicologia hospitalar pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP); coordenadora do Serviço de Psicologia e das pós-graduações em saúde mental e cuidados paliativos do Hospital Sírio-Libanês (HSL); e coordenadora do Comitê de Psicologia da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP).
O médico Henrique Gonçalves Ribeiro, graduado pela FCMSCSP, é especialista em psiquiatria pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e em medicina paliativa pelo Instituto Paliar; médico do corpo clínico do HSL e do Núcleo de Cuidados Paliativos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FM-USP); docente da pós-graduação em cuidados paliativos do Instituto Paliar, HSL e Hospital Israelita Albert Einstein.