A indicação de Alexandre Moraes como Ministro do STF para substituir a recente e controversa morte de Teori Zavascki, demonstrou de maneira curiosa a crônica falta de sintonia entre instituições democráticas e os atores que a preenchem, evidenciando o déficit democrático do país, que ironicamente, viu à luz a (re) democratização sob a orquestração política do PMDB de Temer, então MDB, tecido pelos ideais democráticos em seus discursos.

Em um momento em que o país ainda tenta compreender a morte de Zavascki, ocorrida em um momento crucial das investigações Lava-Jato, em que o Ministro cumpria posição fundamental no desdobramento das investigações, especialmente aquelas com foro especial, a indicação de Moraes torna-se duvidosa, inclusive pelas suas relações como advogado civil da empresa Transcooper, em que a mídia tem apontado vínculos com o Primeiro Comando da Capital (PCC). (http://m.huffpostbrasil.com/2017/02/06/as-controversias-do-novo-indicado-a-ministro-do-supremo_a_21708108/; http://www.cartacapital.com.br/politica/alexandre-de-moraes-e-o-triunfo-da-ineptocracia)
Contudo, além da crítica ético-moral do papel de Moraes, o mais significativo é o momento crucial em que o nome dele é indicado por Temer. O desdobramento da Operação Lava-Jato tem levado a atores-chave, que operam livremente na condução de nossa frágil e tímida democracia, de modo a já serem citados nas delações, passando pelas mais variadas legendas partidárias, inclusive pelo próprio presidente da República, Michel Temer.
Neste contexto, a reiteração do senador Romero Jucá (PMDB) à afirmação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, sobre a necessidade de “botar o Michel num grande acordo nacional” indicam de maneira muito evidente que a substituição à Zavascki acontece de modo a colocar um ponto final na Lava-Jato. Em gravação deflagrada em março de 2016, Jucá acrescentava à fala de Machado: “Com Supremo e tudo(…) Delimitava [ a Lava-Jato] onde está, pronto!”.  Assim, a indicação de Moraes, se analisada à luz de tais fatores, sugere um golpe pesado contra o funcionamento de nossa democracia.Adicionalmente, a queda do avião de Zavascki sugeriu o tensionamento perigoso das investigações da Lava-Jato com a classe política, tornando evidente a necessidade de divulgação dos processos de investigação mais do que nunca, na medida em que, como ministro relator da Lava-Jato, Zavascki investigava o foro privilegiado e tinha informações de importância central.
A publicidade dos processos das investigações é algo defendido até mesmo pelo juiz Sérgio Moro (https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2015/08/10/sergio-moro-defende-publicidade-de-processos-da-operacao-lava-jato.htm)que argumenta a necessidade das mesmas para o bom funcionamento da administração pública. Reiteradamente e indo pouco mais além, não seria exagerado afirmar que a abertura e publicidade de tais investigações configuram-se como fundamentais para a vitalidade de nossa democracia, na medida em que o próprio sentido da representação ganharia muito mais sentido e coerência.
Sem dúvida, há nos fatos, a conflagração de uma bizarra dinâmica que perdura em nossa recém-democracia com todos os problemas de maturação: ela concilia o discurso democrático com práticas assustadoramente perversas; operacionaliza a democracia por meio das instituições propriamente democráticas mas com práticas e atores que debocham, na prática, do ideal democrático, de modo a garantir que a mesma respire confiante desde que não se afronte com os interesses da classe política, demonstrando em ações como a nomeação de Moraes,  o retrocesso de nossa tão frágil,  democracia.  Sara Toledo é pesquisadora do IEEI (Instituto de Estudos Econômicos Internacionais) da Unesp e do NEAI Núcleo de Estudos e Análises Internacionais) – IPPRI (Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais) da Unesp.