Trata-se de (pré)conceito amplamente difundido que o consumo de carboidratos é essencial para a prática esportiva, porque através deles se ingere glicose, macronutriente responsável e alguns dizem imprescindível por gerar e repor a energia gasta na atividade física. Entretanto, atletas de alta performance como Alessandro Silva de Medeiros, desmentem essa visão.
Medeiros, que pratica provas de resistência aeróbia de longa duração há mais de 20 anos, foi o primeiro atleta do mundo a percorrer um trajeto de 160 quilômetros, em cerca de 20 horas, adotando uma dieta com zero carboidratos e em jejum. O feito ocorreu no último mês de setembro, no estado da Flórida (EUA), onde reside. Antes, em 2019, o ironman, ultramaratonista e ultraciclista já havia se tornado o primeiro atleta a participar de um mundial de ultraman – realizado no Hawaii – adotando uma estratégia alimentar cetogênica, ou seja, com baixíssima quantidade de carboidratos.
O médico, diretor-presidente da Associação Brasileira Low Carb (ABLC), José Carlos Souto, esclarece que praticar esportes de alta performance ingerindo de forma regular pouco ou nenhum carboidrato é possível porque o ser humano está apto fisiologicamente a usar também gordura para a produção de energia. De acordo com Souto, a gordura, aliás, é uma melhor fonte, devido à capacidade do corpo ser maior em armazená-la do que a glicose. “O organismo humano apresenta apenas o fígado e os músculos como depósito de glicose, sendo o tecido adiposo um tanque muito mais expansível”, afirma.
Souto explica que o corpo humano tende a utilizar mais glicose para gerar energia porque está acostumado com isso. “Existe um fenômeno que chama oxidação recíproca de substratos. Quando nós temos bastante glicose, o corpo oxida glicose e não gordura. Quando nós temos bastante gordura e pouca glicose, acontece o inverso. Mas se os dois estiveram disponíveis em quantidade iguais, a prioridade vai ser da glicose, porque o corpo sempre tem onde armazenar a gordura”, define.
Isto é o que ocorre com atletas. Eles são orientados desde sempre a ingerir carboidratos para repor as energias, – diretrizes desportivas sugerem o consumo de seis a dez gramas de carboidrato por quilo de peso – por isso utilizam glicose e não gordura para realizar os processos metabólicos. Para alterar tal condição, basta apenas acostumar o corpo de quem pratica atividade esportiva a utilizar ácidos graxos (gordura) no lugar de glicose, tornando a ingestão de carboidratos desnecessária.
Foi o que fez Medeiros, quando resolveu restringir severamente a quantidade de carboidratos de sua dieta, com a orientação de uma nutricionista. Conforme o atleta, em um primeiro momento sentiu falta de energia para realizar os treinos de maneira adequada. Numa tentativa posterior, a prática esportiva se tornou mais fluida, natural e Medeiros começou a sentir os benefícios físicos de uma dieta com baixa ingestão de glicose.
Antes, ao ingerir grande quantidade de carboidratos para repor as energias dispendidas em provas extremas e de longa duração, Medeiros sentia inchaço abdominal, diarreia, tonturas, picos e quedas de energia, vômitos, dores musculares por dias e fadiga extrema nos dias posteriores ao exercício físico intenso. Após a mudança para uma dieta com baixíssima quantidade de carboidrato, o atleta percebeu que sua recuperação pós treino havia se tornado extremamente rápida e as dores musculares praticamente desapareceram. No dia a dia, a sensação de bem estar também foi detectada através da melhora na qualidade do sono, da boa disposição durante todo o dia e da clareza mental.
Os impactos positivos impulsionaram Medeiros a correr os 160 Km sem o uso de suplementos (carboidratos e açúcar) e em jejum metabólico. “Quando o atleta está adaptado a uso da gordura como fonte de energia, ele se torna uma ‘máquina eficiente’”, afirma o ultramaratonista, que passou a adotar a estratégia alimentar com zero carboidratos também para sua vida, de maneira geral. “Sinto-me plenamente bem”, diz.
A história de Medeiros e de muitos outros atletas de alta performance que adotaram uma dieta com baixíssimo ou nenhum consumo de carboidratos e mantiveram bons resultados esportivos, reforça a convicção do médico e diretor-presidente da ABLC de que a estratégia alimentar low carb é útil e recomendável para pessoas sedentárias que desejam emagrecer e ter uma vida saudável praticando atividade física. A despeito do que dizem muitos médicos e nutricionistas. “Se é possível correr 160 quilômetros sem carboidratos, é autoevidente que é possível andar na esteira sem eles”, conclui Souto.