O trabalho remoto foi brutal e caótico para muitos indivíduos e empresas. Todos foram pegos de surpresa com a pandemia e muitas empresas não tiveram maturidade para entender que este momento de disrupção, o home office não deveria ser visto como foi algo ruim, mas sim, como um salto no futuro para incrementar os negócios e melhorar a qualidade de vida dos funcionários.

Muitas empresas, infelizmente, não fizeram melhorias em seus programas de Compliance, com o intuito de ajudar os funcionários e os executivos a terem regras mais claras sobre como deve ser a etiqueta corporativa (boas práticas) durante a pandemia. Não desenvolveram políticas de home office ou de trabalho remoto, as cobranças via WhatsApp ou e-mail literalmente ficaram sem fuso horário. A pressão por produtividade aumentou devido a falsa ideia que trabalhar remotamente significa férias. Também não existiram treinamentos de conscientização sobre as mencionadas boas práticas, nem o apoio do Departamento de Recursos Humanos em estabelecer programas para ajudar na saúde física e mental dos funcionários.

Qual foi o resultado de tudo isso? Existiram muitos excessos, assédio moral virtual e até situações de depressão, síndrome do pânico e, finalmente, burnout de muitos funcionários. Chegamos a um momento em que muitas pessoas estão mental e fisicamente esgotadas.

Segundo um estudo da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, os funcionários que atuaram remotamente trabalharam 30% a mais quando comparado ao período em que estavam fisicamente nos escritórios. Portanto, este estudo comprova que o trabalho remoto funciona, mas que deve ser regulado para evitar os excessos por parte das corporações.

Agora que muitos países já alcançaram taxas altas de vacinação, muitas empresas querem retornar para o modelo antigo. Como exemplo, cito a Goldman Sachs, onde recentemente fiz com que seus funcionários retornassem ao escritório em tempo integral, demonstrando que ainda existe o triste pensamento que somente mediante o “olhar do dono, o gado engorda”. As razões da Goldman Sachs para este retorno presencial foram que as interações face a face são melhores para colaboração e que os funcionários são menos produtivos em casa. Talvez um raciocínio mais sombrio seja eliminar os não-conformistas, com um gerente sênior desta empresa declarou “A Goldman não quer contratar pessoas para as quais o mais importante é quantos dias eles têm para passar no escritório.”

Sem a preocupação com a saúde mental no retorno físico ao trabalho, teremos mais e mais situações de alta rotatividade e pedidos de afastamento por questões de saúde, principalmente no tocante a saúde mental dos funcionários.

Sendo assim, as empresas devem estabelecer metas realistas de retorno, como, por exemplo modelos híbridos de trabalho, principalmente pelo motivo que o retorno ao trabalho envolve mais do que distância física e garantia de que as mesas estejam devidamente espaçadas. Trata-se de encontrar maneiras de diminuir a distância emocional – o que os cientistas chamam de distância afetiva – entre seus funcionários. Alguns serão totalmente remotos; alguns estarão no escritório alguns dias por semana; alguns estarão no escritório todos os dias.

A alta direção deve preocupar-se em organizar momentos de conexão humana concentrada em pequena escala, como, por exemplo, iniciando reuniões perguntando sobre como foi o final de semana da equipe. Esses momentos, considerados não produtivos, ajudam as equipes a se manterem conectadas, a combater o esgotamento e a trabalhar em conjunto de maneira eficaz quando estão fisicamente separados por um longo período.

Nosso conselho é que as empresas reconheçam a realidade do novo mercado de trabalho e se adaptem. Trabalhar remotamente veio para ficar: entre as milhões de empresas que tentaram o trabalho remoto desde o início da pandemia, menos de 20% planejam que voltem ao escritório em tempo integral após o fim da pandemia, segundo reportagem da Harvard Business Review do mês de agosto de 2021. Exigir a presença do funcionário no escritório em tempo integral era fácil em 2019. Já em 2021, ordenar que os funcionários voltem ao escritório em tempo integral representa um risco para as empresas, devido principalmente ao agravamento de doenças mentais ou simplesmente a busca por outras empresas que ofereçam o modelo hibrido aos funcionários.

 

Patricia Punder, advogada é compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020.

Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patrícia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil).