O mito do ganha-ganha

Brasil,

O mito do ganha-ganha

28 de janeiro de 2018

Em gestão, muitos mitos vão se criando impune ou – às vezes – inocentemente. Há os que acreditam de verdade que a propaganda é a alma do negócio. Os que chegam a jurar que o cliente tem sempre razão. Além dos que defendem, com unhas e dentes, que é melhor vender alguma coisa que o cliente não quer ou não precisa comprar do que sair da entrevista sem um “pedidinho”. E por aí vai. Nos seminários e palestras que faço, sempre procuro discutir os deletérios efeitos que a crença em alguns desses mitos acabam por produzir nas organizações. Hoje quero conversar com você sobre um dos mais freqüentes mitos da negociação: o do método ganha-ganha.

Se formos a qualquer dicionário, verificaremos que a palavra método pode ser traduzida como forma ou processo de se fazer alguma coisa. Inspirados pelo mito, alguns negociadores chegam à conclusão que é possível percorrer cada passo do processo de negociação “ganhando” alguma coisa. Vejamos se essa idéia faz sentido. Se toda a negociação tem origem numa divergência quanto aos meios e numa convergência quanto aos fins, o único método possível para chegar a um acordo favorável para ambas as partes é o cede-cede. Tomemos por base uma negociação comercial. O lado “a” quer vender um produto, mas só pode entrega-lo em 90 dias. O lado “b” quer comprar o produto ??? eis aí a tal convergência quanto os fins ??? mas tem que recebê-lo em, no máximo, 45 dias ??? logo, há aqui uma divergência quanto aos meios. Supondo que os prazos reivindicados pelas partes sejam verdadeiros, a única forma de estabelecer o acordo é obtendo de cada lado uma concessão e, por exemplo, fechando o negócio para entrega daqui a 70 dias (ambos tiveram que ceder, não é verdade?). 
Não quero aqui negar que muitas vezes as partes pedem muito mais do que consideram o mínimo aceitável. Aqui a tática é fingir que se está fazendo concessões para obter contrapartidas do outro. Algumas vezes, batemos pé em uma determinada solicitação quando o que verdadeiramente queremos é algo bastante diferente. Nesse caso, a estratégia é levar a outra parte a conceder coisas que ela imagina não ser o nosso principal objetivo. Mas isso é praticar o ganha-perde, não é verdade? Existem inúmeras táticas que, embora levem ao ganha-perde, são amplamente utilizadas visando forçar o outro lado a fazer concessões acima do que seria possível considerar razoável. 
São elas: Cobertor – consiste em revelar tudo aquilo que queremos para depois verificar do que abriremos mão (a analogia é: vamos deixar os pés ou a cabeça descoberta?); Colchete – isolar aquilo que a outra parte mais deseja visando colocá-la na defensiva; Surpresa – súbita mudança do objeto da negociação, deixando a outra parte desconcertada e despreparada para negociar; Intimidação – ameaçar a outra parte ??? sugerindo encerrar a negociação imediatamente; Silêncio – não emitir qualquer opinião ou crítica quanto ao que está sendo proposto, visando desorientar a outra parte; Drible – insistir que queremos uma determinada coisa quando o que nos interessa é outra; Autoridade limitada – criar uma instância superior que precisa ser consultada antes de darmos uma resposta final sobre uma proposta; e Mocinho/bandido – negociadores que trabalham em dupla. Um faz o papel do bonzinho e o outro é o mal. 
Poderíamos aqui mencionar uma lista muito mais ampla, que envolveria truques, artimanhas e falcatruas. Ao conversarmos sobre isso com os participantes dos nossos eventos, um número muito grande afirma utilizar-se desses recursos para obter o acordo. Sua opinião é que estão agindo da forma que propõem os livros e manuais e, consequentemente, não se percebem infringindo qualquer limite ético ou moral. Sinceramente, eu não penso assim. ?? por isso que sempre enfatizo que “é melhor perder um bom negócio do que fazer um mal negócio”. Acredito sinceramente que o principal elemento da negociação é o comportamental. Por isso valorizo tanto o autoconhecimento. Mas há coisas que você, como gestor, pode incentivar a equipe a fazer para visando a melhora da performance de negociador como incentivar as pessoas a se debruçar sobre o processo para identificar pontos fortes da sua oferta e pontos fortes da oferta da outra parte, para que as obrigatórias concessões que farão possam ser recompensadas com vantagens ??? financeiras, emocionais, estratégicas ??? oferecidas pelo outro lado.
Também é necessário definir empatia como uma das melhores estratégias para conseguir “pensar como o outro pensa” e esclarecer que a ideia de ganhar em uma negociação não implica que a outra parte tenha que perder. Estabelecer limites de autoridade para os negociadores, permitindo que eles exercitem sua capacidade de convencimento e troca é um próximo passo, bem como reforçar comportamentos que levam a construção de confiança entre as partes e desestimule aqueles que levam os outros a desconfiar de nós. Para completar, vale a pena dizer que minha crença é que o ganha-ganha existe sim, mas não no processo. Ele é atingido quando ao final da negociação cada parte avalia as concessões que fez e as compara com os resultados que obteve e chega a conclusão que, realmente, valeu a pena todo o esforço.

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O mito do ganha-ganha

Brasil,

O mito do ganha-ganha

11 de agosto de 2017

Em gestão, muitos mitos vão se criando impune ou – às vezes – inocentemente. Há os que acreditam de verdade que a propaganda é a alma do negócio. Os que chegam a jurar que o cliente tem sempre razão. Além dos que defendem, com unhas e dentes, que é melhor vender alguma coisa que o cliente não quer ou não precisa comprar do que sair da entrevista sem um ???pedidinho???. E por aí vai.

Nos seminários e palestras que faço, sempre procuro discutir os deletérios efeitos que a crença em alguns desses mitos acabam por produzir nas organizações.
Hoje quero conversar com você sobre um dos mais frequentes mitos da negociação: o do método ganha-ganha.
Se formos a qualquer dicionário, verificaremos que a palavra método pode ser traduzida como forma ou processo de se fazer alguma coisa. Inspirados pelo mito, alguns negociadores chegam à conclusão que é possível percorrer cada passo do processo de negociação ???ganhando??? alguma coisa. Vejamos se essa ideia faz sentido.
Se toda a negociação tem origem numa divergência quanto aos meios e numa convergência quanto aos fins, o único método possível para chegar a um acordo favorável para ambas as partes é o cede-cede.
Tomemos por base uma negociação comercial. O lado (a) quer vender um produto, mas só pode entrega-lo em 90 dias. O lado (b) quer comprar o produto ??? eis aí a tal convergência quanto os fins ??? mas tem que recebê-lo em, no máximo, 45 dias ??? logo, há aqui uma divergência quanto aos meios. Supondo que os prazos reivindicados pelas partes sejam verdadeiros, a única forma de estabelecer o acordo é obtendo de cada lado uma concessão e, por exemplo, fechando o negócio para entrega daqui a 70 dias (ambos tiveram que ceder, não é verdade?).
Não quero aqui negar que muitas vezes as partes pedem muito mais do que consideram o mínimo aceitável. Aqui a tática é fingir que se está fazendo concessões para obter contrapartidas do outro (em outras palavras: aquilo que dizemos ser o máximo que podemos conceder é apenas o mínimo). Algumas vezes, batemos pé em uma determinada solicitação quando o que verdadeiramente queremos é algo bastante diferente (chamamos isso de agenda oculta). Nesse caso, a estratégia é levar a outra parte a conceder coisas que ela imagina não ser o nosso principal objetivo (um exemplo seria o cliente que insiste em redução de preço quando o que realmente lhe interessa é o prazo de pagamento). Mas isso é praticar o ganha-perde, não é verdade?
Existem inúmeras táticas que, embora levem ao ganha-perde, são amplamente utilizadas visando forçar o outro lado a fazer concessões acima do que seria possível considerar razoável:
Cobertor: consiste em revelar tudo aquilo que queremos para depois verificar do que abriremos mão (a analogia é: vamos deixar os pés ou a cabeça descoberta?).
Colchete: consiste em isolar aquilo que a outra parte mais deseja visando colocá-la na defensiva.
Surpresa: consiste na súbita mudança do objeto da negociação, deixando a outra parte desconcertada e despreparada para negociar.
Intimidação: consiste em ameaçar a outra parte ??? sugerindo encerrar a negociação imediatamente, por exemplo.
Silêncio: consiste em não emitir qualquer opinião ou crítica quanto ao que está sendo proposto, visando desorientar a outra parte.
Drible: consiste em insistir que queremos uma determinada coisa quando o que nos interessa é outra.
Autoridade limitada: consiste em criar uma instância superior que precisa ser consultada antes de darmos uma resposta final sobre uma proposta.
Mocinho/bandido: negociadores que trabalham em dupla. Um faz o papel do bonzinho e o outro é o mal.
Poderíamos aqui mencionar uma lista muito mais ampla, que envolveria truques, artimanhas e falcatruas. Ao conversarmos sobre isso com os participantes dos nossos eventos, um número muito grande afirma utilizar-se desses recursos para obter o acordo. Sua opinião é que estão agindo da forma que propõem os livros e manuais (infelizmente muitos deles realmente propõem isso) e, consequentemente, não se percebem infringindo qualquer limite ético ou moral.
Sinceramente, eu não penso assim. ?? por isso que sempre enfatizo que ???é melhor perder um bom negócio do que fazer um mau negócio???.
Acredito sinceramente que o principal elemento da negociação é o comportamental. Por isso valorizo tanto o autoconhecimento. Mas há coisas que você, como gestor, pode incentivar a equipe a fazer para visando a melhora da performance como negociador:
a)    incentive as pessoas a se debruçar sobre o processo para identificar pontos fortes da sua oferta e pontos fortes da oferta da outra parte, para que as obrigatórias concessões que farão possam ser recompensadas com vantagens ??? financeiras, emocionais, estratégicas ??? oferecidas pelo outro lado;
b)    defina empatia como uma das melhores estratégias para conseguir ???pensar como o outro pensa???;
c)    esclareça que a ideia de ganhar em uma negociação não implica que a outra parte tenha que perder;
d)    estabeleça limites de autoridade para os negociadores, permitindo que eles exercitem sua capacidade de convencimento e troca;
e)    reforce comportamentos que levam a construção de confiança entre as partes e desestimule aqueles que levam os outros a desconfiar de nós.
Por último, vale a pena dizer que minha crença é que o ganha-ganha existe sim, mas não no processo. Ele é atingido quando ao final da negociação cada parte avalia as concessões que fez e as compara com os resultados que obteve e chega à conclusão que, realmente, valeu a pena todo o esforço.

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