A reforma Protestante completa 500 anos e, com ela vem a Contrarreforma, o Barroco e um período de opulência de deslumbramentos artísticos, pleno de contrastes, dramaticidade, dúvidas e agitações sociais. O que esses cinco séculos podem nos trazer de reflexão sobre a vida contemporânea? Atualmente, a arte perdeu boa parte de seu vínculo com a sociedade no sentido de mobilizar as pessoas. Ela pode gerar comoção ao tratar de temas como religião, como ocorreu recentemente em Porto Alegre, ou ao tratar de questões morais, como vivenciamos no MAM em performance com artista  tratando de questões do corpo, mas a discussão é sobre os temas tratados, não especificamente sobre os trabalhos em questão, o que levaria a uma discussão mais estética. Desse modo, o assunto é mais importante do que a obra, o que é ruim para a arte, pois o debate é muito mais emocional e apaixonado do que técnico ou visual. Vivemos, portanto, um momento ambíguo. De um lado, as discussões são muito apaixonadas e radicais em todos os aspectos. Configuram-se dois extremos. Há uma visão que tudo permite sem limites ou reflexões em termos de ética, por exemplo. De outro, há ações e pensamentos conservadores. O melhor caminho parece ser sempre o do diálogo, pois, historicamente, sabemos que toda posição extremada não acaba bem em termos individuais e globais. As polêmicas são saudáveis exatamente porque promovem conversas e estimulam diferentes formas de pensar a, pelo menos, se conhecerem melhor. O Barroco, nesse contexto, foi e continua a ser um momento estético fascinante. Na dicotomia entre a religião, que torna Deus maior que o homem, e a ciência, que torna o homem maior do que Deus, surgem seres angustiados e drapeados maravilhosos nas roupas. Entre a cruz divina e a luneta de Galileu, está uma tensão que nos torna mais frágeis e, por isso, mais ricos em termos de pensamento. O maior fascínio desse processo está na contínua busca por cada um de nós por resolver suas indagações internas sobre a existência. E esse processo costuma gerar trabalhos artísticos de qualidade, muitas vezes excessivos em seu rebuscamento, mas geralmente fascinantes em suas inquietações em busca por respostas para o sentido de estar no mundo.
A criação artística contemporânea, portanto, está além dos rótulos. De fato, os engole, num processo de desconstrução do que conhecemos e os devolve de maneiras muitas vezes inusitadas. Não dá para falar mais num estilo preponderante. Todos eles convivem e se alimentam uns dos outros, numa jornada antropofágica. Nesse contexto, não há mais espaço para o deslumbramento com a arte. O público receptor não é mais ingênuo. Pela internet e pelas mídias sociais, podemos ver de tudo e de todos. Fica muito difícil haver surpresas. Estamos, assim, após 500 anos da reforma protestante, num momento muito rico e peculiar, repleto de possibilidades, mas que só podem ser aproveitadas se não houver posturas dogmáticas que limitem a nossa capacidade de compreensão e apreensão do mundo. Oscar D’Ambrosio é Doutor em Educação, Arte e História da Cultura e Mestre em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Unesp, onde atua na Assessoria de Comunicação e Imprensa.