A ONU foi fundada em um cenário pós duas grandes guerras mundiais, convivendo durante 40 anos em tentar equilibrar os conflitos oriundos da guerra fria entre EUA e a então União Soviética.
No decorrer deste período inicial, e mesmo nos anos posteriores, as organizações multilaterais, bem como instituições e estados têm se modificado muito.
Há um bom tempo os olhares sobre a ONU são diversos, dependendo da solução de modificação que cada espectador possa almejar. Alguns desejam uma mudança radical; outros, mudanças mais amenas, enquanto poucos nada querem mudar no jogo de poderes e objetivos das Nações Unidas.
Paul Kennedy, professor da Universidade de Yale, e autor da obra referência “Ascenção e queda das grandes potencias”, ensina que Harry Truman, Presidente dos EUA tinha a clareza de que o homem sem um organismo global, um parlamento de nações, se autodestruiria. Esta foi a razão da criação da ONU, um foro permanente para discussão de problemas globais e de proteção para as nações. E esta ainda é a necessidade atual da humanidade, sobreviver e não se autodestruir.
Kennedy acredita que até aproximadamente 2045, no centenário da ONU, a China já terá ultrapassado a força econômica dos EUA. Prevê que a Índia poderá ter a terceira economia do mundo, maior do que o Japão, e maior que qualquer país da União Europeia. Afirma, ainda e com bons olhos, a posição do Brasil, Indonésia e Rússia.
É importante ressaltar que a posição do professor Kennedy é relativa a um Brasil da primeira década do Século XXI, que se beneficiava do crescimento de exportação de commodities para uma China francamente compradora, e com crescimento do PIB de cerca de 10% ao ano.
A crítica que se faz é que a Carta da ONU, de 1945, não mais responda ao mundo do Século XXI.
Vivemos hoje a deterioração do meio ambiente, imigrações de milhões motivadas por guerras civis, além de refugiados oriundos destes países em guerra. Populações inteiras que fogem da violência, da fome e da própria crise do clima que prejudica a subsistência e a produção de alimentos.
Ainda temos o crescimento industrial de uma região com bilhões de habitantes, como o continente asiático, indicando o enorme desafio da ONU para responder concretamente contra as mudanças climáticas.
Assim, de nada adiantará o desconforto e protestos da atual e da nova geração de europeus, se as questões relativas à miséria do terceiro mundo não forem resolvidas.
Não se pode negar que o crescimento industrial de países superpopulosos tem impacto global na natureza e na humanidade. A resposta destes certamente será de que Europa e EUA destruíram a natureza para crescer economicamente, não podendo desejar agora frear o crescimento destes países de forma brusca.
Ainda, a crise da pandemia da Covid-19, com baixíssimos números de vacinados em países africanos, a corrida pela compra de vacinas, além do necessário, por EUA e países europeus, exemplificam a ideia da situação de desequilíbrio global e de como a OMS foi ineficiente nesse período. Afinal, vírus em constante mutação ainda é uma ameaça global.
Por seu turno, é de se destacar também, que o atual Conselho de Segurança da ONU não atende mais as necessidades de segurança mundial, de sustentabilidade planetária e de justiça econômica. Alguns podem argumentar que não há relação entre Conselho de Segurança da ONU e meio ambiente. A resposta é: deveria haver.
Também concluímos que não é possível mais conviver com genocídios em Estados que mal conseguem se sustentar, como os vividos no Haiti, Ruanda, Bósnia, Somália, Mianmar, Afeganistão, apenas para citar alguns exemplos.
Abuso dos direitos das crianças, mulheres, meio ambiente, que propiciam forte crescimento de grupos de terroristas, inclusive armando crianças que atuam para esses grupos como soldados precocemente recrutados, antes sequer de terem uma chance de alfabetização.
Por isso, a formação atual do Conselho de Segurança da ONU e seus membros permanentes, EUA, Federação Russa, França, Reino Unido e China, não atende mais os complexos problemas vividos no Século XXI. O dilema continua sendo: ONU versus Soberania e interesses geopolíticos de seus membros permanentes.
É certo que resistências regionais tendem a afetar futuras modificações no Conselho de Segurança da ONU, mas talvez haja soluções em representações regionais, como um assento permanente para grupo de países, ainda que a atual formação da ONU seja o de ser um parlamento de nações.
A ONU sofre dos mesmos problemas que os estados nacionais: organismos sobrepostos, lentidão em dar respostas eficientes, burocratas com alto salários, gigantismo e distanciamento da realidade dos países pobres.
De qualquer forma, olhar o mundo desde uma sala climatizada em Genebra ou de Nova Iorque, não dá mais respostas aos problemas que destroem o planeta paulatinamente.
Cássio Faeddo. Advogado. Mestre em Direito. MBA em Relações Internacionais – FGV/SP