Mais um triste episódio veio à tona essa semana e expôs uma história de dor, recheada por vários tipos de violência contra uma mulher. A atriz Klara Castanho, de 21 anos, foi estuprada, engravidou e escolheu parir a criança e entregá-la à adoção consciente (amparada pela lei). Foi vítima de uma extrema desumanidade através de comentários cruéis do tribunal dos “donos da verdade” que impera na internet, onde em geral todas as premissas partem de um ponto comum: a ignorância perversa. Resultado: o linchamento virtual provocou uma onda de todos os tipos de violência contra a jovem já tão exposta.

A tortura psicológica sofrida por Klara não ocorreu apenas através do estupro, ela se manifesta em forma de constrangimentos quando a violentada precisa vir à público expor sua intimidade. Arguida por uma imprensa descompromissada e por especialistas da área da saúde desprovidos de ética, moral, caráter e profissionalismo. Um circo de horrores que evidencia traços da cultura de violência machista e autoritária que vivemos em nossa sociedade, onde o corpo da mulher deixa de ser responsabilidade dela.

Dentro do pacote de violências entranhadas neste caso doloroso, podemos citar: a violência física caracterizada pelo estupro; a violência moral; a violência da exposição e violação da intimidade; a violência dos julgamentos nas redes sociais (praça pública para as execuções); a violência psicológica, principalmente, por não ter condições emocionais de exercer a maternidade e com isso precisar entregar a criança para adoção; a violência da intolerância; a violência da falta de empatia e acolhimento, que colocam a vítima no papel de culpada. Enfim, fato é que, para quem vive do consumo das matérias sensacionalistas despejadas nos meios de comunicação, em alguns dias ou semanas, essa tragédia será apenas mais um mero episódio de violência. Porém, para a atriz, sua família e, futuramente, para essa criança, as marcas emocionais de tamanha dor, sem dúvida alguma, perdurarão para toda uma vida.

Esse comportamento de ódio, julgamentos e empatia reversa, provoca, instala e ativa o pior que existe no ser humano, além de desencadear na vítima marcas psicológicas, em muitos casos, irreversíveis, devido à coerção psicológica sofrida pelos perversos. Sem contar que o estupro sofrido pela atriz também atinge sua liberdade e seu estado psíquico emocional, uma vez que seu direito de escolha pela privacidade também foi violado e desrespeitado.

A grande verdade é que as vítimas de abusos físicos, morais ou psicológicos precisam e devem receber acolhimento empático, sem julgamentos. Além disso, o acompanhamento psicoterápico também é de suma importância para reconstruir e ressignificar abismos provocados pela insegurança e pelo medo. Elevar a autoestima e empoderar o indivíduo a acreditar que a vida continua, apesar de toda exposição e violação da intimidade.

Enfim, mesmo em meio à dor, Klara teve um ato de extrema coragem que foi entregar a criança para que possa receber afeto e se desenvolver emocionalmente em outro lar. Visto que, a adoção, em casos de estupro, não é considerada abandono de incapaz. No entanto, a falta de informação, a ignorância e a maldade cruel fazem com que pessoas que deveriam proteger e ajudar, usem da fragilidade da vítima para se promover, ignorando o fato de que, maternar não é o único papel da mulher. Infelizmente, o que aconteceu com a atriz é mais uma triste constatação de que vivemos em uma sociedade carente de amor, de proteção, de valores, de caráter e de informação. E enquanto não virar uma prática humana, exercer a empatia e exterminar o falso direito de julgar o outro, ainda veremos vítimas de violência e abusos arrastando correntes eternas e colecionando feridas e marcas por toda a vida.

Dra. Andréa Ladislau / Psicanalista