Para OMS, solidão é uma ameaça global à saúde pública. Psicanalista analisa aspectos psíquicos

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Em novembro do ano passado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) convocou o mundo a refletir sobre o que classificou como uma ameaça global à saúde pública: a solidão.

De acordo com a entidade, a solidão é tão nociva para a saúde quanto fumar 15 cigarros por dia. A falta de socialização está relacionada, ainda, a outros fatores de risco como o consumo excessivo de álcool, sedentarismo e obesidade, além de aumentar em até 50% o risco de demência e em 30%, de AVC.

No aspecto psíquico, completa a psicanalista Tássia Borges – que, nos últimos anos, debruçou-se sobre o tema em razão de sua dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica: “A solidão pode desencadear quadros de depressão, ansiedade e até autoextermínio”.

Entendendo a solidão – Segundo Tássia, existe uma diferença entre solidão e solitude. “A solidão é o estado de alguém que está ou se sente só”, diz. “O sentimento pode surgir até mesmo quando a pessoa está rodeada de pessoas, em bons ou maus momentos. Isto acontece a partir da sensação de que os outros não estão no mesmo estado emocional ou não sentem a experiência da mesma forma”.

Já a solitude é uma relação benéfica com o estado de solidão. “São casos em que o isolamento é voluntário e aprazível”, explica a psicanalista. “Durante o isolamento imposto pela pandemia, muitas pessoas, embora preocupadas, viram esta condição como um alívio no sentido de não precisarem conviver com pessoas ou marcar presença em eventos considerados desgastantes”.

O grande alerta relativo à solidão, além dos pontos citados pela OMS, é que muitas pessoas simplesmente não conseguem ficar só e sofrem demais por isso. Buscam, o tempo todo, uma companhia. E um dos perigos que correm é, em nome desta necessidade, estabelecer relações nem sempre saudáveis.

“Melanie Klein (1882-1960), uma psicanalista de extrema relevância, dizia que, algumas pessoas, vivem a solidão como um estado agudo de desamparo, de abandono ou como uma sensação de estarem sendo perseguidas por objetos hostis. É um sentimento insuportável”, afirma Tássia.

Segundo ela, na clínica, ao receber uma pessoa que não consegue ficar só, “é preciso entender o que se passa no mundo interno dela, ou seja, o que falta nela mesma que a leva a sentir-se completa, apenas, na presença de alguém”.

Embora cada caso seja único – e assim deva ser encarado durante o atendimento psicanalítico – a impossibilidade de estar só pode ter relação com aspectos bem primitivos da infância, ou seja, na forma como se deu a relação mãe/cuidadora e bebê, e na maneira como este bebê “entendeu” o mundo externo a ele. “Klein afirmou que o sentimento de solidão está ligado à sensação de uma perda irreparável, algo irreversível. Outro fator correlato, na minha opinião, é o medo ou a iminência de uma perda. Aspectos que só ouvindo o analisando conseguiremos compreender e ajudá-lo a elaborar”.

Por outro lado, pensando naqueles que se sentem sós mesmo rodeado de familiares e amigos, vale refletir sobre a qualidade destas relações e as expectativas que se tem a respeito delas. “É outra importante contribuição que a psicanálise pode dar”, finaliza a especialista.

 

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