Um adolescente de 16 anos cometeu suicídio, após ter sido alvo de homofobia na internet. A mãe, em um relato emocionante, afirmou: “Peço que vigiem, porque essa internet está doente”. Embora especialistas apontem que não é correto estabelecer uma única causa para um suicídio – que tem múltiplos fatores –, eles ponderam que comentários negativos nas redes sociais podem ser um gatilho. As situações de agressão e sofrimento, decorrentes do cyberbullying nas redes sociais, compõem um fenômeno que demanda uma forte atenção de toda a sociedade: sobretudo de pais, responsáveis e educadores. Há anos defendo, firmemente, a importância da mediação para o uso das redes por crianças e adolescentes, além da capacitação desses jovens para uma exposição que apresenta riscos.

Explicando melhor… a escola e a família precisam ensinar os jovens a lidar com as oportunidades, os riscos e os desafios de estarem conectados. Uma pesquisa da TIC Kids Online demonstra que quando desafiados a julgar as próprias habilidades na internet, 76% dos jovens brasileiros acreditam saber mais do que os pais; 71% afirmam conhecer muito sobre como usar a rede. No entanto, da teoria à prática, em um experimento da mesma organização, 30% dos jovens não souberam verificar se determinada informação na internet estava correta. Esse dado é relevante, porque prova que o nativo digital precisa de orientação; da mediação de professores. E isso inclui orientação sobre o comportamento com relação às pessoas; o refletir sobre como os próprios comentários afetam e como somos afetados por opiniões postadas nas redes. O uso da tecnologia deve ser bem orientado! É aqui que entra a educação para o exercício responsável da cidadania digital.

Educar para a cidadania digital vai além da disseminação da compreensão de conceitos como pegadas digitais. O aluno tem que ser preparado para ver e compreender a relevância desse conhecimento. Esse aprendizado envolve disponibilizar insumos para um alcance pleno da cidadania – ou seja, uma aprendizagem significativa, relevante para o cotidiano do aluno e que o ensine a lidar com questões de saúde da mente frente a questões como o cyberbullying.

Defendo a disciplina de Educação Digital como ferramenta pedagógica para que as escolas possam combater a propagação do preconceito, de atos de intolerância e discursos de ódio on-line, sobretudo nas redes sociais. Com sequências didáticas apoiadas em casos reais, o conteúdo deve ter o objetivo de disseminar entre os alunos com idades entre 13 e 17 anos a noção de que a liberdade de expressão não deve ser confundida com manifestação irrestrita de opinião preconceituosa. Por meio de questões e dinâmicas que despertam empatia, os alunos devem ser convidados a refletir individualmente sobre o tema e debatê-lo em grupo. Assuntos correlatos como limites da privacidade, cyberbullying e assédio on-line são abordados.

Nessa disciplina de Educação Digital, as competências gerais que dialogam com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) podem ser conhecimento; autogestão; pensamento científico, crítico e criativo; repertório cultural; comunicação; cultura digital; argumentação; autoconhecimento e autocuidado; empatia e cooperação; e responsabilidade e cidadania.

Entre as competências e habilidades socioemocionais, destaque para empatia, pensamento crítico, colaboração, argumentação e autonomia. Os eixos estruturantes estão alinhados à investigação científica e mediação e intervenção sociocultural. Nos temas, detox de conteúdo (despadronizando a beleza) e relacionamentos: amizades on-line, tecnologia para estudo, estratégia de busca e avaliação de fontes – informações dentro da perspectiva da autogestão e das boas práticas.

Acredito que a educação digital é uma das formas mais eficientes para combater o uso equivocado das redes sociais e de aplicativos como WhatsApp. Capacitar o aluno para reconhecer quando se está diante de uma fake news, por exemplo, é muito importante. Entretanto, o mais significativo é ter senso crítico e empatia diante de qualquer informação disponível. Combater o bullying – no ambiente físico ou virtual – é construir uma sociedade mais conectada com os valores humanos.

 

Claudio Sassaki

Graduado em Arquitetura pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre em Educação pela Stanford University e cofundador da Geekie, empresa que desenvolveu a primeira plataforma de educação baseada em dados no Brasil. O especialista tem atuado com estudantes e educadores no desenvolvimento de iniciativas inovadoras que potencializam a aprendizagem. A Geekie já impactou mais de 12 milhões de estudantes de 5 mil escolas brasileiras. Entre os reconhecimentos conquistados, Sassaki recebeu os títulos de Empreendedor do Ano (Ernst & Young), Empreendedor Social (Fundação Schwab) e Innovation Fellow (Wired Magazine). Teve oportunidade de contribuir, como palestrante, com o Fórum Econômico Mundial; a Conferência Global de Educação, de Harvard; SXSWEdu; Citizen Education; e TEDx. Vive em São Paulo com a esposa e quatro filhos.