A tecnologia da informação tem mudado todos os aspectos da nossa vida, por isso não é surpreendente que o setor cultural tenha sido influenciado por mudanças dramáticas nas últimas décadas. Não mais do que há 25 anos, pesquisadores, estudantes e cidadãos que procuravam livros, artigos e informações sobre o tema de seu interesse tinham que perder muito tempo em uma biblioteca. Eles tinham que pedir orientação e ajuda de um bibliotecário para fazer sua busca, usando catálogos de fichas em papel e às vezes tinham que esperar várias semanas antes de receber uma cópia disponível em uma biblioteca distante.
O setor de livros foi o primeiro ramo cultural massivamente interessado pela revolução tecnológica, com um aumento progressivo no desenvolvimento de sofisticados OPACs (Online Public Access Catalogs) já na década de 1980 e com a criação de serviços bibliográficos nacionais. Finalmente, também graças ao impulso dado pelo projeto Google Book Search[1], desde 2004, existe a oportunidade de iniciar pesquisas on-line em textos completos de livros e revistas fornecidos por autores, editores e bibliotecas parceiras do Google. Esta iniciativa revelou evidentemente um imenso potencial de acesso ao conhecimento humano. Levantou também a amplitude dos aspectos legais relacionados com a gestão dos direitos de propriedade intelectual dessas publicações. Uma conseqüência direta desse processo é a relevância assumida pelo conceito Creative Commons[2], nascido em 2002 com o objetivo de disponibilizar o maior número de trabalhos criativos ao público, de forma legal e compartilhada, e agora licenciando mais de 1,2 bilhão de obras.
Outras atividades no âmbito cultural – principalmente museus e arquivos, mas também sítios arqueológicos e complexos arquitetônicos, além do patrimônio intangível, como gravações de áudio e vídeo – não esperaram muito tempo para começar a investigar os possíveis benefícios oferecidos pela tecnologia da informação. Aqui, a tarefa é mais desafiadora, principalmente devido a dois aspectos principais: a singularidade da obra de arte e as três dimensões características de muitos dos objetos de interesse. Isto contrasta com o setor de livros, pois uma vez catalogados e digitalizados, a cópia do texto dispensa a repetição da mesma operação com todas as outras cópias existentes.
?? evidente como isso afeta o desenvolvimento metodológico e tecnológico necessário para enfrentar essas questões, envolvendo vários desafios, como por exemplo: a definição de padrões comuns para a digitalização, a resolução da digitalização (scan) a ser utilizada, a necessidade de modelos 3D, a elaboração de ferramentas multilingues e semânticas para melhorar a descrição dos objetos, o uso de tecnologia de realidade virtual ou aumentada para aprimorar a experiência dos usuários, entre outros.
Orçamentos substanciais têm sido investidos em todo o mundo para apoiar essas pesquisas, devido à crescente importância da cultura e do turismo cultural para o desenvolvimento econômico dos diferentes países. Desde o início do século XXI, um grande esforço foi iniciado na Europa, bem como no Brasil e na América do Sul, para lançar um conjunto de programas de cooperação entre universidades, centros de pesquisa e indústrias, com foco no desenvolvimento de ferramentas inovadoras, fortalecimento dos serviços culturais, políticas de homogeneização do patrimônio digital. Vários projetos contribuíram para o desenvolvimento da Europeana[3], a plataforma para a cultura digital, coletando contribuições de mais de 3.000 instituições em todo o continente, provindo de museus consolidados de todo o mundo até instituições culturais locais e regionais que gerenciam coleções pequenas e temáticas.
Atualmente, há cerca de 500 projetos de cooperação transnacional lançados na Europa, desde 2014, com foco em questões relacionadas à sociedade e o patrimônio digital e que estão desenvolvendo modelos e tecnologias inovadores com o objetivo de ampliar o acesso e aumentar o uso criativo de acervos culturais. Apesar da cooperação em ações de pesquisa e inovação assinadas entre o Brasil e a União Européia, pesquisadores brasileiros estão envolvidos apenas em dois dos projetos atuais, nenhum deles diretamente concentrados no desenvolvimento tecnológico. ?? por isso que, no dia 29 de novembro p.p., o Acordo Bilateral[4] foi renovado e ampliado para abrir caminho a novas ações conjuntas envolvendo mais diretamente as Universidades e Centros de Pesquisa do Brasil.
Na Edição 94 da revista UNESP Ciência[5], já foi anunciada a EVA / Minerva Brasil Conferência Internacional de Tecnologias Avançadas para a Cultura. Este evento programado para ocorrer em São Paulo, em março de 2019, pretende ser uma oportunidade para compartilhar conhecimentos e idéias entre pesquisadores brasileiros e europeus, definir e lançar projetos conjuntos, visitas de estudo e desenvolvimentos futuros. Será também uma oportunidade para desenvolver o debate nas instituições culturais brasileiras, nas indústrias criativas e entre os cidadãos na sociedade civil. A cada dia, a gestão da cultura não é mais uma questão limitada a um número restrito de especialistas, principalmente interessados ??em preservar e proteger nosso patrimônio, mas está se tornando um elemento-chave da política de desenvolvimento socioeconômico.
A conferência será então uma oportunidade para fortalecer a cooperação política, as relações e as redes entre todas as partes interessadas envolvidas na discussão participativa sobre novos modelos de governança patrimonial e inovação social para a cultura no Brasil. Abordagens participativas no patrimônio cultural oferecem oportunidades para promover a interação democrática, a sustentabilidade e a coesão social e enfrentar os desafios sociais, políticos e demográficos de hoje. Eles são um instrumento fundamental para ajudar a proteger e aumentar o valor social do patrimônio cultural, fortalecer sua contribuição para o crescimento econômico e a criação de emprego, bem como desenvolver o seu potencial para compartilhar valores culturais e abrir caminho a laços mais fortes entre indivíduos, governos e instituições.