Quantos partidos? Mais de três décadas se passaram desde a promulgação da Constituição de 1988 e a disputa sobre as regras do jogo político segue no centro do debate nacional. Entre os consensos construídos ao longo desse período, destaca-se a percepção de que a fragmentação partidária excessiva prejudicaria a capacidade do sistema de produzir um governo eficiente.
O pluralismo expressado na grande oferta de siglas no mercado político pode ser um indicador da diversidade democrática do país, mas também foi visto, ao longo dos anos, como um desafio considerável para a formação de coalizões e para a tomada de decisão.
O Brasil, com sua estrutura federativa e profundas clivagens sociais e regionais, adotou um sistema eleitoral proporcional que favoreceu, durante décadas, o multipartidarismo, que muitos chamam de exacerbado. A regulação desse pluralismo impôs-se, então, como um dilema permanente: restringi-lo artificialmente pode reduzir a representação, mas exacerbá-lo gera dificuldades para a governabilidade.
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A necessidade de conter essa fragmentação foi um dos fatores que levaram à aprovação da Emenda Constitucional nº 97/2017, que proibiu as coligações nas eleições proporcionais e introduziu a cláusula de desempenho progressiva. Essas mudanças começaram a reconfigurar o sistema partidário: partidos que não atingiram o desempenho mínimo perderam acesso ao fundo partidário e à propaganda eleitoral gratuita, levando a fusões e incorporações.

Sede do TSE
De 30 partidos com representação na Câmara dos Deputados em 2018, restaram 23 após a janela partidária de 2022. Um dos resultados deste movimento é a maior concentração das cadeiras nos partidos mais robustos, o que aumentou, significativamente, a concentração de poder em menos líderes políticos.
No entanto, a redução do número de partidos não implicou em uma melhora automática da governabilidade. O que se pode observar é uma possível crescente dificuldade do Executivo em impor sua agenda no Legislativo. O enfraquecimento do presidente frente ao Congresso se intensificou no período recente, com a ascensão das emendas parlamentares impositivas e a amplificação do poder do Legislativo sobre o orçamento.
Esse fenômeno, que já se manifestava no governo Bolsonaro, tornou-se ainda mais evidente no terceiro mandato de Lula. Se, em governos anteriores, o legislativo reclamava da invasão em suas competências pelo excesso de edição de medidas provisórias editadas pelo Executivo, agora, o problema parece ser a crescente cooptação das prerrogativas do Executivo pelo Congresso.
A dinâmica institucional indica que a relação entre fragmentação partidária e governabilidade é mais complexa do que uma simples relação de causalidade entre o número de partidos e a estabilidade do governo. A capacidade de governar, ao que tudo indica, depende menos do quantitativo de siglas e mais do arranjo institucional e dos mecanismos de coordenação entre os poderes.
As mudanças recentes podem não apenas ter reduzido o número de legendas, mas também ter concentrado poder em poucos líderes políticos, potencialmente ampliando a personalização das decisões e reduzindo a previsibilidade do processo legislativo.
Diante desse cenário, é necessário perguntar: a percepção de piora no quadro institucional e na governabilidade é uma consequência direta da redução do número de partidos, ou se trata apenas de uma correlação sem relação de causa e efeito?
* Thiago Esteves é mestre em Ciências Políticas pela Escola da Câmara dos Deputados, advogado e sócio da Eixo Relações Institucionais
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