Por que certos líderes homens chegaram ao topo, mesmo demonstrando falhas evidentes em suas competências?

Esta é uma questão recorrente em determinadas empresas e ganha ainda mais relevância quando nos perguntamos: “por que tantas mulheres competentes e preparadas continuam sub-representadas em cargos de liderança?”.

Esse fenômeno, analisado por estudiosos de comportamento organizacional, pode estar relacionado à forma como interpretamos os traços de liderança e como o mercado de trabalho privilegia características equivocadas na hora de promover pessoas.

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A questão não é nova, mas a pandemia e o contexto de trabalho remoto trouxeram novas camadas de complexidade a essa discussão. Cito, a seguir, três pontos pelos quais essa situação acontece com frequência e como essa realidade afeta as organizações e a diversidade nas lideranças.

1. Confiança disfarçada de competência

Estudos realizados por universidades americanas, como a da Califórnia e Harvard, mostraram que confiança excessiva em si mesmo é um traço frequentemente associado a lideranças, especialmente no caso de homens. No entanto, essa confiança não se traduz, na maioria dos casos, em um desempenho superior.

No Brasil, o problema é igualmente evidente. Em nossa cultura organizacional, líderes que falam alto e dominam as reuniões são muitas vezes preferidos, mesmo que suas decisões nem sempre sejam as mais fundamentadas ou produtivas. Esse tipo de comportamento cria um ambiente em que os “mais barulhentos” sobem, enquanto profissionais mais competentes, mas que talvez sejam mais reservados, acabam marginalizados.

A solução não está em adotar uma liderança mais discreta, mas em como as empresas podem revisar seus critérios de promoção e avaliar lideranças com base em dados concretos, ao invés de se deixarem levar apenas por carisma ou presença.

2. O mito do carisma

Por que tantos homens incompetentes chegam a cargos de liderança?

O carisma é frequentemente enaltecido como um traço essencial de bons líderes. Muitos dos líderes que vemos em destaque na mídia ou em grandes corporações no Brasil são descritos como carismáticos, e esse “fator X” muitas vezes cega a avaliação crítica sobre suas reais habilidades de gestão. Esta é uma qualidade que pode mascarar incompetências e desviar o foco das questões estruturais.

O problema surge quando o carisma é supervalorizado como critério de competência, levando empresas a ignorarem profissionais altamente capacitados, mas que podem adotar um estilo de liderança mais técnico ou colaborativo.

Para mudar esse cenário, é preciso que as empresas brasileiras revejam como avaliam e promovem seus líderes, focando menos em qualidades superficiais e mais em como cada profissional contribui para resultados reais e sustentáveis.

3. Falta de diversidade na liderança

A ausência de mulheres em cargos de liderança é um reflexo de uma combinação de preconceito estrutural e critérios de promoção enviesados. Embora se fale muito sobre igualdade de gênero, os dados mostram que ainda estamos longe de alcançar um equilíbrio nas posições de poder. Mulheres representam apenas cerca de 37% das posições de liderança nas empresas brasileiras, e essa diferença é ainda maior em setores como tecnologia e finanças.

A tendência de promover homens que não demonstram competência suficiente só acentua esse problema, perpetuando um ciclo em que as mesmas características — muitas vezes, inadequadas — continuam sendo recompensadas. Quando a liderança é composta majoritariamente por homens com perfis semelhantes, cria-se uma barreira invisível para a ascensão de mulheres e outros grupos sub-representados.

A solução vai além de abrir mais vagas para mulheres; passa, também, por reformular a forma como as empresas entendem a liderança e promovem seus funcionários. Diversidade nas lideranças não é apenas uma questão de justiça social — é uma vantagem competitiva, pois traz perspectivas variadas que enriquecem a tomada de decisão e a inovação dentro das organizações.

Novo modelo

Para reverter essa tendência de incompetência nos cargos de liderança, as organizações precisam adotar uma abordagem mais criteriosa e baseada em dados ao avaliar seus líderes. Isso significa abandonar o culto ao carisma e à confiança excessiva, focando em habilidades técnicas, inteligência emocional e capacidade de entregar resultados de longo prazo. Além disso, é imperativo que a diversidade seja vista como um pilar essencial para a construção de um ambiente de liderança mais equilibrado e justo.

A mudança não virá da noite para o dia, mas o primeiro passo é reavaliar as métricas de sucesso e as expectativas em torno da liderança. Somente assim poderemos promover líderes que realmente têm a competência necessária para guiar suas equipes e organizações rumo ao sucesso, ao invés de perpetuar uma cultura que valoriza o “confiante incompetente”.

Virgilio Marques dos Santos é um dos fundadores da FM2S, gestor de carreiras, doutor, mestre e graduado em Engenharia Mecânica pela Unicamp e Master Black Belt pela mesma Universidade. TEDx Speaker, foi professor dos cursos de Black Belt, Green Belt e especialização em Gestão e Estratégia de Empresas da Unicamp, assim como de outras universidades e cursos de pós-graduação. Atuou como gerente de processos e melhoria em empresa de bebidas e foi um dos idealizadores do Desafio Unicamp de Inovação Tecnológica.

 

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