Tempo e espaço são ficções que criamos para exercer nossa lógica. Só, evidentemente, os humanos os consideram. Neles navegamos. Produtos de equações acuradas de nossos sábios permitiram o desenvolvimento da vida. Nosso tempo previsível é o que medeia entre nascimento e morte, se nenhuma condição extraordinária tiver o condão de romper a previsão. Espaço vem do recorte geopolítico de nossos povos, que estabelecem soberanias, linguagens, costumes, numa diversidade que fez a heterogenia do homem. Em verdade, essas duas verdades abstratas, projetadas pela razão, sempre andaram juntas e firmaram nossos destinos.
Poucas vezes o tempo e o espaço condicionaram tanto a vida nacional brasileira. Nosso imenso espaço político e suas diversidades não permitem que um governo provisório, enredado em compromissos de ética menor dos quais não pode fugir, herança maldita do que se foi tarde, atenda de imediato aos reclamos dos inúmeros povos que vivem no Brasil. Por exemplo, a completude da transposição do rio São Francisco, que há pouco dois grupos reivindicaram radiantes, às margens plácidas de outro córrego da Independência . Nem neste, nem no próximo governo, livremente eleito, e bom, se Deus quiser, essa obra grandiosa será completada. ?? preciso muito diálogo com as populações afetadas e o desenvolvimento da consciência de que o nordeste, neste mundo conturbado onde sobra dinheiro em contas correntes chinesas e outras, pode ser vocacionado ao turismo e precisará menos das águas do velho Chico, por mais que esse raciocínio imploda fetiches.
O tempo é fatal ao governo de Michel Temer. Pouquíssimo tempo e vasta imperiosidade de fazer conchavos, com seu PMDB fâmulo das posses privadas e outras agremiações famintas que passaram a integrar sua base de apoio. Enquanto o governo não faz milagres, a esquerda, a plenos pulmões, solta sua gritaria por meio de vozes que se tornaram fracas ou roucas pela corrupção que consumiu seus antigos timbres da esperança ética. Essa a razão pela qual o governo transitório resume sua agenda. Para ver o possível, porque não vemos muito. E, ainda, de modo infeliz, anatemiza a previdência e as relações de trabalho, a ponto mesmo de cogitar de medidas provisórias para revogar instituições jurídicas que se formaram universalmente e no decorrer de mais de um século.
Cremos que Temer deveria preocupar-se tão somente em sanear o pesado Estado brasileiro. Não o conseguiria, por inteiro, mas, pelo menos, passaria a seu sucessor um fardo menor. Diminuiria o tamanho e melhoraria a administração federal, em todos os níveis, inclusive no continental INSS, em que as atividades-meio consomem mais recursos que os benefícios, apontados como os grandes vilões do debacle. Quanto à reforma trabalhista, deveria conduzir, com sua autoridade, diálogos muito profundos, entre empregados e empregadores, durante todo seu mandato, a fim de prepar-se um Código do Trabalho e de Processo do Trabalho. Muitas ideias brilhantes poderiam surgir, de grandes especialistas e, principalmente, dos protagonistas, patrões, empregados e profissionais liberais, da nossa atividade econômica.
Nossas leis duradouras foram feitas ao longo de décadas, como o Código Civil. No século XXI, claramente, podemos abreviar esse tempo. Mas elas não brotarão desse congresso e desses inomináveis compromissos que o governo tem de amarrar com seus súcubos e cujos nós já se soltam. Não é preciso, Presidente Temer, escolher temas que, no imaginário político, poderiam vencer o desafio do tempo e do espaço. Sua posse foi inquestionavelmente constitucional. Ocorre que constitucionalidade não é legitimidade. Esta vem das urnas. Prepare o cenário para que novo político comece, apenas comece, a salvar o Brasil. O senhor não é salvador da pátria. Nem o próximo o será, mas estará forrado daquele manto que não o agasalha. E poderá dar o passo inicial da criação. Sim, o Brasil precisa ser criado. Os últimos dois governos apregoavam que eram seus criadores, “como algo jamais visto na história deste País”. Envergonharam-se feitos marolinhas numa praia respeitável. Os sebastianistas esperam um líder. Ele não virá. Poderão vir ocasiões, se o senhor preparar devidamente a sucessão.
Se padeces de receios ante os movimentos da justiça brasileira, paciência, fizeste parte do pacto de Fausto com Mefisto. A Justiça não pode e não deve parar. E que as urnas sejam dignas de todos os brasileiros, não, mais uma vez, ferramenta demagógica de uma burocracia empedernida.
Amadeu Roberto Garrido de Paula, é Advogado e sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados, com uma ampla visão sobre política, economia, cenário sindical e assuntos internacionais.