Heigne Allegmane, o inventor do spray para demarcação de barreira no futebol, obteve uma vitória contra a FIFA no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro na data de ontem (27/10). Por unanimidade de votos, a 14ª. Câmara Cível do Tribunal de Apelação acolheu o recurso apresentado pela Spuni, a empresa de Allemagne, determinando que a FIFA indenize os danos causados em razão pela utilização não autorizada do spray em competições de futebol.

O valor da indenização será definido em uma próxima etapa processual, mas apenas uma parte da indenização devida é estimada, na peça que inaugurou o litígio, de 2017, em mais de R$ 50 milhões.

O Tribunal também reconheceu na data de ontem a má-fé da FIFA decorrente da falta de lisura nas negociações existentes entre o inventor e a entidade. A FIFA agiu de modo contraditório e violador da confiança, abusando da boa vontade da Spuni e do inventor, utilizando o spray gratuitamente e se valendo do know how da empresa para treinamentos e implantação do equipamento, enquanto ao mesmo tempo ocultava a marca do fabricante.

Embora a FIFA ainda possa recorrer da condenação, os fatos não mais comportam discussão nos Tribunais brasileiros.

A vitória do inventor do spray na Justiça do Brasil poderá impactar discussões em diversas jurisdições sobre o direito de indenização em virtude da possível violação de patentes e, ainda, da infração às normas éticas e de compliance. A empresa de Heine Allmagne obteve a proteção da patente em outros 43 países além do Brasil.

O Comitê de Ética da FIFA, sediado em Genebra, abriu uma investigação oficial em 2020 para apurar eventuais desvios éticos e legais decorrentes da utilização de sprays não patenteados em competições oficiais a pedido dos advogados de Heine Allemagne. A investigação foi sumariamente encerrada após a FIFA ter obtido uma sentença favorável na primeira instância, que agora foi revertida no Tribunal de Justiça. A reabertura da investigação será uma das frentes internacionais a serem analisadas pelos advogados do inventor.

ENTENDA O CASO

O sistema do spray de barreira consiste em um aerossol para marcação do campo de jogo com uma espuma volátil, que desaparece em questão de segundos e modificou o futebol de maneira substancial. O cumprimento da regra de distância para as faltas gerou dinamismo, mais tempo de bola rolando e mais gols. A Spuni obteve a patente do produto em 44 países.

Heine Allemagne, inventor brasileiro e proprietário da Spuni, assessorou a FIFA na implantação do recurso, que passou a fazer parte da regra do jogo instituída pela FIFA/IFAB. O spray foi utilizado nas Copas do Brasil (2014) e da Rússia (2018) e em diversas competições organizadas ou supervisionadas pela FIFA. Contudo, a Spuni e o inventor jamais foram adequadamente reconhecidos ou recompensados — situação que viola uma garantia fundamental e que configura prática ilícita no Brasil e em diversas jurisdições.

A empresa que é detentora dos direitos, então, ajuizou demanda condenatória em 2017 que pedia, liminarmente, a aplicação de multa pelo uso não autorizado do spray. O produto parou de ser usado em alguns campeonatos, e, em outros, a decisão era simplesmente descumprida. A ação foi proposta perante a Justiça Estadual do Rio de Janeiro. Dois revezes foram enfrentados pela Spuni no decorrer do processo: foi proferida sentença desfavorável em primeiro grau ao seu pedido indenizatório, e o Superior Tribunal de Justiça entendeu que apenas seria possível apurar, perante a Justiça brasileira, os danos causados à Spuni em território nacional.

A decisão unânime proferida na data de ontem (27/10) pela 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro restabelece a justiça ao reconhecer as atitudes abusivas da FIFA e o seu dever de indenizar os danos causados. O advogado Gustavo Kloh sustentou oralmente pela Spuni.

Processo n° 0314313-89.2017.8.19.0001.