Nos últimos anos, a utilização da inteligência artificial (IA) para recriar imagens e vozes de pessoas falecidas em campanhas publicitárias tem gerado debates intensos sobre os limites éticos e legais desse recurso. Em 2023, por exemplo, a Volkswagen foi alvo de grande repercussão ao lançar uma campanha publicitária que “reviveu” a cantora Elis Regina, falecida em 1982, para cantar ao lado de sua filha, Maria Rita. Este caso gerou discussões não apenas sobre o uso ético da tecnologia deepfake, mas também sobre as implicações legais associadas a esse tipo de manipulação digital.

No Brasil, o uso de deepfakes para fins comerciais, como em campanhas publicitárias, precisa respeitar os direitos de personalidade assegurados pela Constituição Federal, incluindo o direito à imagem, à voz, e à memória. O Código Civil, em seu Artigo 20, prevê sanções civis, como indenizações por danos morais e materiais, em casos de uso indevido da imagem. No entanto, a situação se complica quando há algum tipo de autorização formal, como o consentimento de familiares quando se trata da recriação de algum falecido para fins comerciais.

Além disso, há o Projeto de Lei  n.º 2338/2023, em tramitação no Senado Federal, que busca estabelecer diretrizes para o uso ético da IA, incluindo a responsabilização de agentes envolvidos em casos de uso abusivo e intensivo de tecnologia deepfake.

Publicidade digital e imagens da IA, quais os limites?

Enquanto o Brasil ainda busca estabelecer parâmetros mais claros, outras legislações internacionais têm avançado nesse campo. Na União Europeia, por exemplo, o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) define claramente os direitos dos indivíduos em relação aos seus dados pessoais, incluindo imagens e voz, e impõe sanções severas para o uso não autorizado desses dados. Além disso, o AI Act prevê uma série de salvaguardas para que sistemas de IA de alto risco sejam disponibilizados, exigindo transparência no desenvolvimento e uso de IA.

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Segundo Lucas Maldonado D. Latini, advogado e especialista em direito digital pela FGV, há usos considerados éticos e aceitáveis da tecnologia deep fake. Por exemplo, quando a tecnologia é usada para paródia, desde que autorizado pelo detentor de direitos de imagem. Porém, quando a recriação se destina a fins comerciais, a complexidade jurídica aumenta. “O uso para criar novas obras é ético apenas se estiver de acordo com as leis brasileiras, que protegem tanto a obra original quanto a imagem dos indivíduos envolvidos”, explica Maldonado.

Nos Estados Unidos, alguns estados, como a Califórnia, aprovaram leis que proíbem o uso de deepfakes para influenciar eleições ou difamar candidatos políticos. No Brasil, a única regulamentação sobre o tema é a Resolução 23.732/2024, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que disciplina o uso da IA nas eleições deste ano, mas sua aplicação é restrita ao contexto eleitoral.

Além da publicidade

Além das questões legais e éticas, o uso de deepfakes em campanhas publicitárias levanta preocupações relacionadas à desinformação. A manipulação digital de imagens e vozes pode induzir o consumidor ao erro, comprometendo a transparência e impactando a confiança na marca. Como destaca Maldonado, “a disseminação de deepfakes em contextos publicitários, especialmente sem o devido esclarecimento de que o conteúdo é gerado por IA, pode gerar confusão e comprometer a credibilidade da empresa”, alerta o advogado.

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