Título: Neve de primavera (Mar da fertilidade, v. 1)

Autor: Yukio Mishima

Tradutor: Fernando Garcia

Formato: 16 x 23 cm / 400 páginas

ISBN: 978-65-86068-93-1

Lançamento: 14/10/2024

Preço: R$89,00

Neve de primavera, de Yukio Mishima- 1o vol da tetralogia "O mar da fertilidade"Neve de primavera é o primeiro volume da tetralogia Mar da fertilidade, do japonês Yukio Mishima. O romance se passa nos momentos finais da era Meiji e iniciais da era Taisho, no começo do século xx, e acompanha Kiyoaki Matsugae, um jovem aristocrata em transição dos anos escolares à vida universitária.

O rapaz se relaciona com a família, dando ensejo para discutir tradição, nobreza e decadência; com colegas estrangeiros, o que permite problematizar a ocidentalização do país, um dos temas mais recorrentes na ficção japonesa moderna; com o criado Iinuma, a partir do qual se apresentam questões de classe; e ainda com o amigo Shigekuni Honda e a namorada Satoko Ayakura, relações estas que possibilitam debater amor, paixão, sexualidade, budismo e uma geração que já não recorda a Guerra Russo-Japonesa, encerrada poucos anos antes da narrativa, com triunfo do poder imperialista do Japão, tão caro a Mishima.

Assim como em outros livros, e neste mais do que em muitos, o autor ostenta exuberância na linguagem, sobretudo ao compor descrições de vestuário e do corpo humano.

Faz uso atinado de uma série de metáforas e comparações para dar à história camadas a mais de significado e beleza, como quando, por exemplo, compara Kiyoaki com “sua maneira de viver dedicada apenas às emoções” a “uma bandeira que tremula ao vento”.

O próprio título Neve de primavera, que insere um resquício de inverno na estação seguinte, indica que eras, estações, pessoas e gerações morrem, é verdade, mas passam adiante traços que de certo modo as mantêm vivas.

sobre o autor

 

yukio mishima, nascido Kimitake Hiraoka em Tóquio em 1925, estreou na literatura com apenas dezenove anos. Pouco depois, com Confissões de uma máscara (1949) e Cores proibidas (1951), firma-se como o grande talento artístico de sua geração. Mesclando influências ocidentais e orientais, explorando tabus temáticos, como a homossexualidade e o culto ao corpo masculino, e produzindo excessivamente, Mishima não separa sua arte de suas próprias ações.

Cada vez mais crítico da ocidentalização do país no pós-guerra, ele leva seu nacionalismo ao extremo em 1970. À frente de seu grupo paramilitar Tate No Kai, invade um quartel do Exército japonês em Tóquio buscando incitar um golpe de Estado que devolveria os poderes divinos ao imperador. Sem obter a acolhida esperada, termina seu discurso e comete seppuku, suicídio ritualístico samurai, deixando perplexos seus milhões de leitores no Japão e no mundo.

Pela Estação Liberdade, o autor teve publicados Kawabata-Mishima: Correspondência 1945-1970 (2019), volume que traz as cartas trocadas entre ele e seu conterrâneo e Prêmio Nobel Yasunari Kawabata; e os romances Vida à venda (2020), O marinheiro que perdeu as graças do mar (2022) e A escola da carne (2023).

Os demais romances que integram a tetralogia também serão publicados pela Estação Liberdade: Cavalos selvagens (v. 2), O templo da aurora (v. 3) e A queda do anjo (v. 4).

repercussão

“Lemos Neve de primavera por causa dos incidentes maravilhosos do livro, pitorescos e filosóficos, e das cenas tão atraentes à contemplação, em cuja aliança emocional com a natureza, emancipada da ‘patética falácia’ do Ocidente, Mishima se mantém consistentemente japonês.”

—   Hortense Calisher, The New York Times

“Em Mar da fertilidade, [Mishima] escolheu se valer de uma grande tela, como fazia seu herói Thomas Mann. Assim, ele exibe todos os seus dons: bom olho para o detalhe e a construção de cenas, interesse na sensualidade e um desprendimento arrojado que chega a assustar de tão conciso.”

—   Richard T. Kelly, The Guardian

 

trechos

“Quando falaram na escola a respeito da Guerra Russo-Japonesa, Kiyoaki Matsugae experimentou perguntar a seu amigo mais próximo, Shigekuni Honda, se ele se recordava bem daquela época; porém, a memória de Shi­gekuni também era difusa, e ele se lembrava apenas vagamente do momento em que fora levado até o portão para ver a procissão luminosa. Como ambos já contavam onze anos de idade quando a guerra acabara, Kiyoaki pensou que seria natural terem uma recordação um pouco mais nítida. Mas os colegas do mesmo ano escolar que falavam de modo presunçoso sobre aquela época na verdade não faziam mais que adornar as lembranças que acreditavam ter com as conversas que haviam entreouvido dos adultos.” [p. 9]

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“No entanto, o peito másculo e coberto de pelos de Iinuma, o qual vinha realizando esse diálogo dentro de seu coração com tanto fervor a ponto de se esquecer do frio, despontou para fora da gola do quimono e o entristeceu, por fazê-lo constatar que não lhe fora concedido um corpo que correspondesse ao seu coração límpido. Em contrapartida, a alguém possuidor de um corpo puro, alvo e gracioso como Kiyoaki, faltava um coração simples, masculino e fortificante.” [p. 81]

“Ele perdera Satoko. Estava bem assim. Dentro de algum tempo, aplacou­-se até mesmo aquela sua raiva tão intensa. Suas emoções foram poupadas de modo esplêndido: se ele estivera alegre e animado como se houvesse sido acesa uma chama dentro dele, e se a vela que antes derretia em cera quente tivera sua chama apagada com um sopro, deixando seu corpo iso­lado em meio às trevas, em compensação ele se encontrava agora em um estado similar ao de quem já não teme que algo venha lhe roer o corpo. Pela primeira vez aprendeu que a solidão é uma trégua.” [p. 175]

“Os dois se deitaram no tatame e voltaram os olhos para o teto, onde havia ressuscitado o som violento da chuva. O palpitar no peito de ambos não sossegava tão facilmente, mas Kiyoaki, cujo cansaço não é preciso men­cionar, encontrava-se enlevado por não querer reconhecer sequer que algo havia chegado ao fim. Contudo, se tornou claro também que entre os dois pairava um arrependimento semelhante a uma sombra, acumulando-se no quarto que anoitecia pouco a pouco. Ele pensou ter ouvido o sutil tossir de uma pessoa de idade além do genjibusuma e, embora houvesse começado a levantar o corpo outra vez, Satoko puxou seu ombro de leve para impedi-lo.” [p. 200]