O México encontra-se em plena campanha eleitoral. Em 1 de julho, os cidadãos e as cidadãs elegem o próximo presidente, senadores e deputados federais. No primeiro debate presidencial, realizado em 22 de abril de 2018 na Cidade do México, os candidatos debateram os temas da “segurança pública e violência”, o “combate à corrupção e à impunidade” e a “democracia, pluralismo e grupos em situação de insegurança”. Participaram Margarita Zavala, Jaime Rodríguez, ambos candidatos independentes, Ricardo Anaya, do Partido da Ação Nacional (PAN), José Antonio Meade, do Partido Revolucionário Institucional (PRI), e Andrés Manuel López Obrador, do Movimento Regeneração Nacional (Morena).
Os cinco candidatos são os que apresentam maior intenção de voto, de acordo com as últimas pesquisas eleitorais realizadas no país. Segundo o periódico Reforma (2018), em pesquisa de abril, Andrés Manuel López Obrador tem 48% das intenções de voto, seguido por Ricardo Anaya, com 26%, José Antonio Meade, com 18%, Margarita Zavala, com 5%, e Jaime Rodríguez, com 3%.
O alto nível de combatividade entre os candidatos pode ser explicado sobretudo pela posição de López Obrador nas pesquisas. Diante deste cenário, o debate esteve em grande parte restrito à ele, Ricardo Anaya e José Antonio Meade, este em um plano mais secundário. Os temas colocados em debate são aqueles considerados chave para o eleitorado e que representam desafios concretos para o próximo presidente eleito, principalmente as medidas a serem adotadas para conter o crescimento da violência no México e aquelas para combater a corrupção. Neste contexto, quais são as principais propostas apresentadas pelos candidatos?
No tópico “segurança pública e violência”, todos os candidatos destacaram a necessidade de fortalecer a capacidade de investigação do Estado. Foram citadas medidas como o uso mais intensivo de tecnologia, o investimento nas polícias e o combate à impunidade. José Antonio Meade e Ricardo Anaya postularam-se favoráveis à lei de Segurança Interior, ainda que o segundo tenha defendido o emprego do Exército e da Marinha apenas até a “profissionalização” da política municipal e estadual, ao ponto em que sejam “confiáveis”.
Margarita Zavala, Ricardo Anaya e Andrés Manuel López Obrador também destacaram a necessidade de investir em educação, combater a pobreza e gerar postos de trabalho como medidas de combate à violência. Por sua vez, Jaime Rodríguez apresentou a proposta de que as preparatórias no México, equivalente ao ensino médio no Brasil, fossem “militarizadas”, ou seja, que o Exército deveria ser o responsável em dar aulas. Essa foi citada como um exemplo de sucesso utilizado em Nuevo León, estado em que ele foi governador.
Este é um tema caro para Margarita Zavala e Ricardo Anaya. Em oportunidades anteriores, a candidata e também esposa de Felipe Calderón defendeu a estratégia militarizada empreendida durante a gestão do marido como presidente do México, de 2006 a 2012. Em sua gestão, deu-se o início da “guerra às drogas” no México e o subsequente acordo de combate ao narcotráfico com os Estados Unidos, a Iniciativa Mérida. Apesar de não ter feito parte do governo de Calderón, Ricardo Anaya depara-se com as críticas internas à esta estratégia, alavancada pelo partido que ele preside e pelo qual disputa a presidência.
No debate, todos os candidatos atacaram a proposta de Andrés Manuel López Obrador de “anistiar” os narcotraficantes, a qual foi feita em discurso no estado de Guerrero, em dezembro de 2017. O candidato não explicou claramente como isso seria feito, apenas mencionou que estaria sujeita a acordo com o Congresso. López Obrador afirmou também considerar um diálogo com o governo norte-americano em prol da diminuição do consumo das drogas e a instauração de uma comissão para ouvir as vítimas de violação de direitos humanos. De acordo com o candidato, a medida justifica-se no objetivo de atingir justiça, não vingança.
Independentemente da proposta apresentada pelos candidatos neste tema, nenhum  deles defendeu a estratégia de combate às drogas de Calderón. Os números recentes da violência no México foram citados nas perguntas dos jornalistas. A partir de abril de 2015, os índices de homicídio, extorsão e sequestro aumentaram progressivamente, tendo sido 2017 o ano mais violento das últimas duas décadas no país. De acordo com os dados do Secretariado Executivo do Sistema Nacional de Segurança Pública, o México registrou 29 homicídios para cada 100 000 mil habitantes, sendo Guerrero, Estado do México e Baja California os estados mais violentos.
No que se refere à “combate à corrupção e impunidade”, a principal proposta dos candidatos foi a necessidade de nomear um “Fiscal de Justiça” autônomo e independente. O cargo foi criado com as reformas estruturais em 2012 e integra o Sistema Nacional Anticorrupção. Com a extinção da Procuradoria Geral da República, o então procurador, Raúl Cervantes, foi nomeado automaticamente como Fiscal para um mandato de nove anos. Tal passe foi amplamente criticado por organizações civis e partidos oposicionistas, como o próprio PAN, já que Cervantes possui formação dentro do PRI. Diante da polêmica, ele renunciou em outubro de 2017, tendo crescido a demanda para que o novo fiscal fosse apartidário.
Ricardo Anaya propôs que o mandato presidencial pudesse  ser revogado diante de crise de legitimidade. Este é um mecanismo não regulado pela Constituição Federal do México, a qual prevê no Artigo 108 a destituição do presidente em caso de “traição à pátria” e “delitos graves de ordem comum”. A saída de Dilma Rousseff do cargo e a atuação do judiciário brasileiro no combate à corrupção aparecem com freqüência na mídia mexicana como exemplos e possíveis inspirações nesse sentido. Ainda nesta seção, Jaime Rodriguez chegou a propor que as mãos dos servidores públicos envolvidos em atos de corrupção deveriam ser cortadas.
Andrés Manuel López Obrador, por sua vez, propôs a possibilidade de revogação do mandato por meio de um referendo, o qual se comprometeu a lançar a cada dois anos. O candidato foi rebatido, tendo José Antonio Meade argumentado que isso traria instabilidade política e econômica ao país. Especificamente no combate à corrupção, o candidato argumentou que irá governar através do exemplo, em uma estratégia “top down”, desde os mais altos escalões do governo até a sociedade civil. Ele também prometeu acabar com os privilégios que hoje desfrutam os servidores públicos e a elite política, quem ele caracteriza de “máfia do poder”.
Neste debate, não foram lançadas as propostas de política econômica e nem os princípios que devem nortear a relação do México com os Estados Unidos de acordo com cada candidato. Apesar de as pesquisas de intenção de voto indicarem a vitória de Andrés Manuel López Obrador, é cedo para qualquer prospecção. O seu índice de rejeição é alto, o que se pode atribuir à sua personalidade, para muitos centralizadora, mas também a uma intensa campanha dos partidos tradicionais contra a sua candidatura. Argumenta-se que a democracia mexicana está ameaçada, além de o risco de o México “tornar-se a Venezuela”, com a posse de um governo de centro-esquerda.
Não há dúvida de que a sua vitória representaria uma alternância política no México, depois de 77 anos do PRI (1929-2000 e 2012-2018) e 12 anos do PAN (2000-2012). Contudo, ainda há grandes incertezas que podem interferir no rumo das eleições, desde a possibilidade de fraudes, como amplamente se especula em 2006, até os desdobramentos da “guerras às drogas” e a própria renegociação do NAFTA, em andamento.
Marcela FranzoniMestra e estudante de doutorado pelo Programa de Pós-graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP e PUC-SP), São Paulo, Brasil. Pesquisadora no Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais (IEEI) e no Núcleo de Estudos e Análises Internacionais (NEAI).