Empresas de tecnologia de grande porte (big techs)

têm passado por momentos de reestruturação que, frequentemente, resultam em demissões em massa – conhecidas como layoffs. Essas demissões têm gerado preocupações sobre o impacto que elas estão tendo na vida e na carreira de profissionais sub-representados no mercado de trabalho. Embora a maioria das grandes empresas de tecnologia tenha práticas sólidas de diversidade, inclusão e sustentabilidade, as demissões pesaram sobre áreas específicas, atingindo perfis de gênero, raça e classe bem definidos. Não é à toa que a corda sempre arrebenta do lado menos representado e historicamente mais vulnerável.

De acordo com o Layoffs.fyi – que acompanha os cortes de mão de obra na indústria de tecnologia –, a maioria das pessoas que perderam seus empregos na recente onda de demissões são mulheres e pessoas negras; as funções e os cargos mais afetados pelos layoffs são das áreas do cuidado (vendas, marketing, suporte ao cliente, recursos humanos e recrutamento). O levantamento mostra que as demissões podem estar afetando desproporcionalmente grupos minoritários e sub-representados dentro das empresas, tornando ainda mais difícil a entrada e o crescimento deles em um setor dominado por homens cisgêneros brancos.

A filósofa estadunidense Angela Davis discute o existente – e profundo – vínculo ideológico entre racismo, viés de classe e supremacia masculina. Para Davis, mais do que uma ação ao acaso, esses acontecimentos históricos como os layoffs, na minha leitura, são estruturados em processos desumanizadores de controle social Ou seja, embora essas empresas realmente estejam passando por problemas financeiros, muitas delas são obcecadas pelo crescimento rápido e pelas receitas a curto prazo, o que leva a práticas de negócios e a uma cultura de trabalho insustentável.

Manter pessoas diversas demanda muito mais responsabilidade e comprometimento, sobretudo para uma comunicação mais humanizada entre as pessoas e para processos mais complexos e estruturados que criem uma cultura organizacional verdadeiramente inclusiva. Entretanto, no anseio pelo crescimento exponencial, escolhas são feitas, e manter a diversidade, muitas vezes, não é uma delas.

A contratação e o patrocínio de programas representaram um passo positivo para a diversidade no setor de tecnologia, porém, as demissões em massa representam um retrocesso monumental que compromete seriamente o futuro da diversidade nesse setor.

­­| JUDÁ NUNES

Graduada em Licenciatura em Teatro pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Judá Nunes – especialista em Diversidade, Equidade e Inclusão; analista de ESG; e LinkedIn Top Voices Orgulho – atua como educadora, gestora de projetos, comunicadora, escritora, palestrante e consultora de empresas para o tema diversidade e inclusão. Mentora de executivos interessados em entender melhor a dinâmica de diversidade no século XXI, desde 2016 pesquisa gênero, educação, movimentos sociais, trabalho e transformação humana; seus estudos deram suporte ao desenvolvimento de uma metodologia exclusiva e crítico-analítica para a formação de executivos (educação corporativa) e gestão de projetos de impacto social com foco em Diversidade, Equidade e Inclusão. Mais informações: contatojudanunes@gmail.com.

Demissões nas big techs. 2 visões

Demissões nas big techs. 2 visões

Como as demissões em big techs podem influenciar o mercado brasileiro 

Entre o fim de 2022 e o início deste ano, as empresas do setor de tecnologia demitiram mais de 100 mil colaboradores ao redor do mundo e mais da metade deste número vieram das “big techs”, empresas que dominam o setor. Este mesmo grupo, que inclui Apple, Microsoft, Meta (dona do Facebook, WhatsApp e Instagram), e Alphabet (Google) perderam quase U$4 trilhões em valor de mercado ao longo do ano de 2022, de acordo com a consultoria TradeMap.

Alguns motivos podem estar relacionados às demissões em massa que ocorrem atualmente, como a insegurança na economia global, o aumento da inflação nos Estados Unidos, onde a maioria das demissões aconteceram, mas principalmente o alto número de contratações feitas durante a pandemia, que muitas vezes não se fazem mais necessárias.

“A pandemia fez com que a aceleração digital de empresas de pequeno, médio e grande porte fossem potencializadas de maneira ainda mais significativa, o que resultou em mais contratações naquele momento. Com o retorno de um cenário parecido com o que vivíamos antes do início da COVID-19, essas empresas tiveram de fazer cortes para equilibrar a equação de funcionários”, explica João Gabriel, head de tecnologia e Top Voice do LinkedIn.

Movimento pode impactar setor no Brasil?

Na mão contrária desta tendência, o Brasil deve chegar em 2025 com um déficit de quase 800 mil profissionais no setor tech, o que evidencia a necessidade da formação de novos especialistas para preencher a lacuna existente no país.

Mesmo com a alta demanda de profissionais, as demissões recentes no setor devem impactar o mercado brasileiro de tecnologia. Com mais profissionais no mercado, as vagas devem se tornar mais concorridas entre os novos profissionais e aqueles que buscam recolocação profissional.

“Este movimento de demissões deve sim impactar as empresas do país nos próximos meses. Naturalmente, com mais candidatos, a concorrência nas vagas será maior, e os profissionais que possuem experiência levam ligeira vantagem em relação aos candidatos que estão tentando a primeira oportunidade no mercado de tecnologia”, conta João.

Realocação no mercado de trabalho

Buscar um novo emprego pode ser difícil, muitas pessoas passam longos meses entre a saída de um trabalho e o recomeço da vida profissional. Mesmo com o mercado aquecido, o setor tech pode apresentar situações em que o profissional passe algum tempo sem uma nova chance e tenha que maximizar suas oportunidades de conseguir uma vaga, por meio de estratégias que o façam ser notado.

“Atualizar o currículo e LinkedIn são itens obrigatórios para quem está em busca de uma vaga de emprego hoje em dia, e isso vale para qualquer área, mas pensando principalmente no mercado de tecnologia, ter conexões que possam auxiliar em alguma oportunidade, por meio de conselhos e indicação é essencial”, relata o especialista.

Um movimento muito comum dos últimos anos tem sido a busca de outros países por profissionais brasileiros. De acordo com uma pesquisa da Husky, plataforma que facilita o recebimento de transferências internacionais, o número de profissionais que vivem no Brasil mas trabalham no exterior saltou 491% entre 2020 e 2022, e a tecnologia da informação é o setor com mais procura.

“Os profissionais de tecnologia são muito visados pelo mercado atualmente, então mesmo com as demissões no exterior e por aqui, eles devem conseguir se recolocar rapidamente para outras posições, pois a maioria possui experiência e conhecimento para atuar em empresas de pequeno, médio e grande porte”, finaliza o head de tecnologia.

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Sobre O Matuto Programador

Top Voice do Linkedin, João Gabriel é head de tecnologia na Ideen. Formado em Sistemas da Informação pela Fundação Santo André e em Big Data – Inteligência na gestão de dados pela escola Politécnica da USP, possui mais de 14 anos de experiência na área. Atualmente é seguido por mais de 90 mil pessoas no Linkedin, além de conduzir o podcast 404 no Youtube e ser fundador da Compass Tech, empresa de recrutamento de tecnologia.