Os conservadores individualistas vêm o ser humano como uma ilha isolada de qualquer promontório. Em geral abastados, creem que se bastam. Um dia a solidão cobrará o preço dos sibaritas. Assim foram vistas, durante os milênios da história, as mulheres. Não votavam, não se educavam. Uma raça subserviente. Napoleão, depois de uma refrega, comunicava-se com sua mulher para não se lavar, pois adorava mulheres sujas. Se transportamos uma carga genética desde as cavernas, as mulheres contemporâneas precisam lutar para não se acomodar à condição de escravas solícitas e alienadas. A maioria de hoje luta e busca seu lugar ao sol. Drasticamente, isso tem menos de 50 anos.
A mulher que nasce pobre, pouco se educa e se acultura, e é bela, termina num casamento das cavernas. O homem, quase sempre, sem necessidade de letras, se impõe como o dono dos negócios que permitem a sobrevivência da família. A mulher o respeita profundamente, seja por necessidade de sobrevivência, seja por temor reverencial, seja por amor, ou por todas essas causas conjugadas.
Não temos nenhuma pesquisa indicativa do número de mulheres livres, independentes, cultas, governantes, em cotejo com as nascidas numa casa de pau a pique e que optaram por um casamento e ao papel sagrado de mãe que entrega todas suas forças para ancorar a família. No meio rural as mulheres arranham suas peles nas folhas de relva e, ao chegar em seus casebres à noite, ainda têm de preparar a “minestra” e cuidar dos filhos. Conhecem-se as reivindicações femininas das mulheres que se encontram no mercado de trabalho, em geral justas, mas a desgraça que as abate não se comparam com a vida dessas mulheres dos lares toscos de nosso país.
“Dona” Marisa Letícia, obviamente, jamais tomou ciência e tampouco consciência, enquanto “primeira dama”, dos meandros podres da política de coalizão e concertada com as grandes construtoras a serviço, ou desserviço, de nosso acervo púbico. Em casos parecidos, a mulher sequer indaga dos atos profissionais da vida do homem. Por falta de conhecimento e timidez.
Vai que o marido se torne apoplético face a uma pergunta infeliz…
Nesse ambiente, as mulheres assinam tudo e fazem de tudo. Acreditam piamente que o marido, assim como ela, não se desvia um minuto da retidão, porque esse é o caminho do bem familiar. Seu dever é acompanhar sistematicamente o companheiro.
E o que dizer quando ele é o Presidente da República, o homem mais importante do país. Só pode ser coberto de mérito e de virtudes. Personalidade internacional. Desconfiar da origem de seus bens, de resto modestos? Não. A nota fiscal da compra de uns madeiros para o sítio de Atibaia podia ser emitida em seu nome e ficar à disposição de quem quer seja. Maior ingenuidade? Visitar um “triplex”, num prédio simples no Guarujá, também era algo inerente às possibilidades de um Presidente da República.
Obviamente, não culpamos Lula por seu óbito. Outros casos semelhantes permeiam a literatura criminológica. Culpamos os costumes. “O tempora. O mores” exclamou Cícero, indignado com os costumes sórdidos de seu tempo. A reiteração de condutas populares pressupõem sua moralidade e legitimidade. Todavia, também não podemos admitir as perorações mercuriais de Lula, ao atribuir tudo às “elites”, a “eles” (séquitos de Mefistófelis?) à “burguesia”, ao juiz Sérgio Moro que recebeu uma denúncia inicial de um fato tipificado como criminoso, à operação Lava-Jato, montada exclusivamente para destruir o PT.
Em direito penal tem curso a teoria da “consciência do ilícito”. Todos, pobres e ricos, sábios ou não, não podem se escusar arguindo o desconhecimento da lei. O princípio é evidente ao se tratar de um homicídio. Nossa natureza profunda e inconsciente sabe que não é lícito matar, furtar ou roubar.
Todavia, os menos conhecedores não sabem distinguir entre doação, corrupção ou concussão. Respondem por simples presunção de conhecimento. E assim muitas mulheres caminham para o pantanal. Quantas mulheres foram indiretamente beneficiadas pela sórdida corrupção que pôs em coma nosso País? Só Marisa foi exposta e a veia assassina fez seu trabalho demoníaco numa mulher ainda jovem.
Era um bom ponto de defesa para Marisa, pois o processo penal já é constrangimento. Agora se extingue em relação a ela (“mors omnia solvit”). Tanto que se concede ordem de “habeas corpus” para trancar de imediato ação penal iniciada sem justa causa. O processo penal pende como uma lâmina suspensa e capaz de descer a todo momento sobre a cabeça de quem pretende dormir. Sobretudo dos mais simples.
Marisa, sim, pagou com a vida o terremoto moral que abalou nossa política do lulopetismo; e que não se resume a ele. Não é, porém, uma mártir como Joana D’Arc. Foi uma simples mulher, vítima dos costumes, que, um dia, foi ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, para cuidar do recebimento da pensão por morte de seu primeiro marido, e foi atendida pelo futuro Presidente, também viúvo, sem suspeitar das ferragens que determinam o destino de cada um neste mundo de Deus.