Com publicação pela editora Laranja Original, “Oratório” (56 pág.) é o terceiro livro de poemas da multifacetada artista Ana Salvagni (@salvagni.ana)
Além de escritora, possui graduação em Regência pela Unicamp, dedicando-se principalmente à música popular brasileira. Além disso, possui quatro álbuns gravados, sendo o terceiro, “Alma Cabocla”, vencedor da 21ª edição do Prêmio da Música Brasileira. Salvagni é natural de Taquaritinga, mas encontra-se há mais de três décadas radicada em Campinas, no interior de São Paulo.
Trazendo à tona uma coleção única de reflexões sobre o cotidiano, a condição feminina, a sensualidade e a espiritualidade, “Oratório” traz consigo referências e leituras ao longo de dez anos, incluindo autores como Hilda Hilst, Fernando Pessoa, Manoel de Barros, Paulo Leminski e José Paulo Paes, que Salvagni considera como algumas de suas principais influências.
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Para Aercio Flavio Consolin, que assina o prefácio, a divindade a que se dirigem as súplicas nos poemas de Salvagni tem um caráter panteísta, bucólico e sincrético. “Outra espécie de religião emana dos poemas: é o ligar fortemente o indivíduo à percepção de si, dos anseios da alma buscando localizá-los nas amplidões da Natureza ou no corpo humanamente frágil e assediado por aflições e necessidades que estimulam reações. Os versos revelam maturidade literária no tom da admiração pelas paisagens mínimas que o olho atento e sensível emoldura”, escreve.
“Oratório”: um livro criado em três movimentos
Segundo a autora, o processo criativo de “Oratório” foi intenso, embora tenha ocorrido em períodos distantes entre si. Alguns poemas, como “Cordão”, “Voraz”, e “Alerta”, são de uma época que a escritora chama de “seca”, ou seja, um tempo em que quase não escrevia e por isso produziu muito pouco, mas que, por outro lado, a conexão nascida com aqueles poucos textos foi a semente para o livro que lança agora. Um segundo grupo de poemas foi produzido mais recentemente e é o que engloba, entre outros, as “Preces”, poemas em forma de oração, ou, talvez, orações em formato poético. “Estes são dez textos, todos nascidos nos últimos três anos aproximadamente, o que coincide com o isolamento pela pandemia da Covid-19”, afirma. Por fim, os poemas mais novos, como, por exemplo, “Partilha” e “Tocata”, surgem no fluxo maior de criação e já a partir da possibilidade de publicação da obra.
A composição do livro foi, para a autora, resultado de uma extensa busca pela expressão de sensações e sentimentos, não necessariamente com a intenção de construir uma obra coesa, mas, a princípio, por necessidade e gosto em se exercitar na escrita poética. Ao tratar de temas que atravessam os desejos e os prazeres nas coisas mais simples, e, pela primeira vez, adentrando o campo da espiritualidade, Salvagni reconhece que os poemas têm forte ligação com situações eventuais de sua vida. “Embora não seja uma regra, às vezes uma poesia parece nascer ‘do nada’… de toda forma, sendo ou não, possível, identificar uma situação pessoal em um poema, é muito bom quando os leitores se reconhecem e se apropriam deles, de forma muito particular”, pondera.
Cantora, regente e escritora: conheça as muitas faces de Ana Salvagni
Nascida em Taquaritinga/SP, em 1969, Ana é mais conhecida enquanto cantora e regente. Há mais de três décadas radicada em Campinas/SP, desde 1988, ela é reconhecida não apenas por suas contribuições à literatura, mas também por seu papel fundamental no cenário musical. É regente de corais e integrante do grupo Flor da Pele, além de compartilhar sua paixão pelo canto, também através do ensino. Seu trabalho musical inclui a gravação de quatro álbuns: “Ana Salvagni” (1999), “Avarandado” (2005), “Alma Cabocla” (2009) e, em parceria com o violonista Eduardo Lobo, “Canção do Amor Distante” (2016). O álbum “Alma Cabocla” recebeu o 21º Prêmio da Música Brasileira (2010) na categoria “Melhor Álbum”, solidificando a posição de Ana Salvagni como uma artista de destaque.
Além de sua carreira musical, Salvagni também sempre gostou de escrever – algo que começou a experimentar ainda na infância. “Sempre tive predileção, na escola, pelas matérias de Língua Portuguesa, Literatura e Redação. Posso me lembrar de um pequeno texto escrito por volta dos 13 anos, algo que, pela primeira vez, reconheci como poesia”, conta. Mas foi só na idade adulta, entre os 18 e os 25 anos, que a literatura a atravessou com força. Nessa época, ela conta que viveu um período onde tanto a leitura quanto a escrita se tornaram mais intensas. Entretanto, o primeiro livro, “Janela sem Tranca” só veio mais tarde, aos 36 anos, “depois de muitas dúvidas, reflexões e trocas de experiências com outros autores”, conta.
Ao mesmo tempo, a escritora acumula um currículo respeitável no mundo das palavras. Salvagni foi cronista do jornal Correio Popular, de Campinas. Seu primeiro livro, “Janela sem Tranca” (2006), foi prefaciado por Chico César, e, o segundo, “Fotos do Espelho” (2013), conta com apresentação de Carlos Vogt.
“Tenho trabalhado em uma série de haicais e este deverá ser o meu próximo livro, mesmo que eu ainda precise de mais um ou dois anos, para aumentar a produção e amadurecer a escrita. Além deste, em algum momento, deverei retomar o projeto de um livro de crônicas”, conta a autora, sobre projetos futuros no campo literário.
Confira um o poema “Prece IX”, de “Oratório” :
mãe, senhora
leva-me ao teu caloroso colo
lava-me com teus cheiros
amacia-me com tuas ervas
enfeita-me com as miúdas flores
acalenta-me até que alvoreça em mim o sentido
e o impulso
senhora mãe dos abertos e seguros caminhos
dá-me a hora feliz de poder soltar-te a mão
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