Imagine a reunião ocasional de uma família tradicional. Todos a comentar banalidades, até que um dos adolescentes profere, fora de contexto, o termo proibido: sexo! Não seria difícil imaginar as cenas seguintes. Os mais velhos arregalariam os olhos e fechariam a cara. A mãe, envergonhada, repreenderia: ???o que é isso, garoto?!???. O pai, confuso entre a moral e o orgulho machista, se calaria. Os primos, se alternariam entre a zoeira e os risos sorrateiros de meia boca. Passado o choque, nenhuma palavra a mais, vira-se a página e passa-se ao próximo assunto… A ???deixa??? para abordar um dos tabus mais venenosos da atualidade é mais uma vez desperdiçada.

A sociedade ocidental é perita na disseminação de um mecanismo perverso. Enquanto as propagandas mercadológicas e as programações televisivas banalizam o sexo, a religião o reprime moralmente, tendo, a tiracolo, todo o medo milenar do fogo do inferno. O resultado não poderia ser outro: nega-se a falar do assunto com naturalidade no ambiente seguro da família, enquanto bordeis e abortos se multiplicam no submundo social.
Mas nem é preciso se aprofundar nesses extremos para diagnosticar o quão patológico é tal mecanismo de estímulo e repressão. Basta verificar na internet o incalculável número de sites especializados em suprir a demanda de viciados em pornografia. Não se trata, aqui, de tentar limitar o que o indivíduo pode ou não optar como lazer, mas sim constatar os efeitos prejudiciais decorrentes do hábito. 
Pesquisas recentes de psicologia comprovam que a pornografia ???enfraquece??? o córtex pré-frontal, a área do cérebro responsável pelo ???controle executivo??? das decisões pessoais. Ou seja, o consumo desse tipo de conteúdo virtual para compensar as tensões sexuais reprimidas deixa as pessoas mais impulsivas e infantis, com menor capacidade de tomarem decisões racionais para lidar com situações práticas da vida. Lembremos ainda que pessoas impulsivas são as que geralmente cometem os crimes contra si e o próximo. 
Não precisa ser assim. A ciência já comprovou que o sexo, com compromisso e afetividade, pode inundar o corpo humano com os neurotransmissores responsáveis por gerar bem-estar, saúde e equilíbrio. Mas, enquanto o assunto se mantiver como tabu, não se chegará à naturalidade necessária para o surgimento de relacionamentos saudáveis a esse ponto. Por isso, é hora de romper os tabus e passar a dar ao assunto a naturalidade inerentemente humana que lhe pertence.  E a família é o melhor contexto de diálogo. 
*Cássio Gonçalves é músico e jornalista