Mounjaro reduz em 20% tumores de câncer de mama em camundongos, aponta novo estudo
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Uma pesquisa inédita da Universidade de Michigan demonstrou que a tirzepatida, medicamento comercializado como Mounjaro para diabetes e Zepbound para obesidade, foi capaz de reduzir tumores de câncer de mama em camundongos ao mesmo tempo que promoveu significativa perda de peso nos animais. Os resultados foram apresentados em julho durante a ENDO 2025, reunião anual da Sociedade de Endocrinologia.
O estudo testou o medicamento da classe GLP-1 em 16 camundongos jovens com câncer de mama. Os animais foram propositalmente engordados e mantidos em ambiente aquecido para estimular a obesidade, recebendo tirzepatida ou placebo a cada dois dias durante 16 semanas.
Os dados mostraram que os camundongos perderam cerca de 20% do peso corporal, e à medida que reduziram peso e gordura hepática, seus tumores também diminuíram proporcionalmente. “Este é um achado muito promissor que sugere que os benefícios dos agonistas de GLP-1 podem ir além do controle do diabetes e da perda de peso”, avalia Alessandra Rascovski, endocrinologista e diretora clínica da Atma Soma. “A relação proporcional entre a redução do peso e a diminuição dos tumores indica que os mecanismos envolvidos podem estar relacionados tanto à perda de peso quanto a efeitos diretos do medicamento sobre o metabolismo celular.”
Câncer de mama: principal preocupação feminina
O câncer de mama é o tipo mais comum entre as mulheres no Brasil e no mundo, com impacto direto na mortalidade feminina. No país, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), são estimados mais de 73 mil novos casos para cada ano do triênio 2023-2025. A obesidade é reconhecida como fator de risco tanto para o câncer de mama pós-menopausal quanto pré-menopausal, embora os mecanismos sejam diferentes.
“A obesidade promove um estado inflamatório crônico e altera os níveis hormonais, particularmente de estrogênio, o que pode favorecer o desenvolvimento de tumores mamários”, explica Rascovski. “Medicações que não apenas promovem a perda de peso, mas também podem ter efeitos anti-inflamatórios diretos, representam uma abordagem muito interessante na prevenção.”
Limitações e próximos passos
Embora os resultados sejam promissores, os pesquisadores alertam que se trata de um estudo pré-clínico em modelos animais, sendo necessários ensaios clínicos em humanos para confirmar a eficácia e segurança do uso da tirzepatida especificamente para prevenção do câncer de mama.
“É fundamental entender que estamos falando de pesquisa básica, em modelos animais. Ainda precisamos de muito mais evidências antes de considerar o uso destes medicamentos, especificamente para prevenção de câncer”, pondera Daniel Gimenes, oncologista da Oncoclínicas. “No entanto, os achados são consistentes com o que já observamos em estudos observacionais em humanos”.
Mecanismos além da perda de peso
Os achados da Universidade de Michigan complementam evidências robustas já obtidas em pacientes humanos. Em junho, durante a reunião anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco), pesquisadores apresentaram dados de uma ampla análise com 170.030 pacientes com diabetes e obesidade, que demonstrou redução de 7% no risco de desenvolver 14 tipos de câncer relacionados à obesidade entre usuários de medicamentos como Ozempic, Wegovy e Mounjaro.
A pesquisa da Asco, liderada por Lucas A. Mavromatis, acompanhou pacientes em 43 sistemas de saúde dos Estados Unidos entre 2013 e 2023. Os resultados mostraram que aqueles que usaram agonistas de GLP-1 apresentaram não apenas 7% menos risco de desenvolver cânceres associados à obesidade, mas também 8% menos chance de morrer por qualquer causa.
O estudo avaliou 14 tipos de câncer com comprovada relação com a obesidade: adenocarcinoma do esôfago, mama (em mulheres pós-menopáusicas), intestino, reto, útero, vesícula biliar, parte superior do estômago, rins, fígado, ovários, pâncreas, tireoide, meningioma (tipo de câncer cerebral) e mieloma múltiplo. A proteção foi especialmente significativa para tumores colorretais: 16% de redução para câncer de intestino e 28% para câncer retal. Entre as mulheres, houve uma redução de 8% no risco de câncer e uma redução de 20% na mortalidade por todas as causas no grupo que utilizou agonistas de GLP-1.
O interesse científico nesta área está crescendo rapidamente. Em julho do ano passado, uma pesquisa publicada na revista JAMA Network Open, com 1,6 milhão de pacientes diabéticos, já havia encontrado redução em pelo menos 10 tipos de câncer ligados à obesidade.
“Esses medicamentos parecem ter propriedades que vão muito além do que conhecíamos inicialmente. Estamos observando efeitos anti-inflamatórios e uma modulação metabólica que pode interferir diretamente nos processos de crescimento tumoral. É uma linha de pesquisa fascinante, mas que ainda demanda estudos mais robustos para estabelecermos protocolos clínicos”, observa Gimenes.
Outro estudo apresentado no Congresso Europeu de Obesidade, em Málaga, encontrou resultados similares aos observados em pacientes submetidos à cirurgia bariátrica, sugerindo que os mecanismos de proteção podem ir além da simples perda de peso.
Como agem as chamadas canetas emagrecedoras
A obesidade está associada ao desenvolvimento de diversas doenças, como a Diabetes tipo 2 e Hipertensão Arterial, além de aumentar consideravelmente as chances de Acidente Vascular Cerebral (AVC), doença cardiovascular, aparecimento de diversos tipos de câncer e até demência, entre outros.
“Inicialmente desenvolvidas para combater a diabetes, as canetas vem sendo usadas por especialistas também no combate à obesidade, um uso off label, mas que não é prejudicial. E já há canetas voltadas especialmente para a obesidade, inclusive, aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em geral, elas agem simulando a ação do GLP-1, hormônio produzido no intestino que regula a glicemia, diminui a fome e aumenta a saciedade”, explica Rascovski.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a pessoa é considerada obesa quando seu Índice de Massa Corporal (IMC) é igual ou superior a 30 quilos por metro quadrado (kg/m²). A faixa de peso normal varia entre 18,5 kg/m² e 24,9 kg/m².
Atualmente, cerca de 31% da população brasileira vive com obesidade, e 68% têm excesso de peso, somando sobrepeso e obesidade. De acordo com dados apresentados no Congresso Internacional sobre Obesidade (ICO) do ano passado, quase metade dos brasileiros adultos (48%) sofrem com essa condição e mais 27% terão sobrepeso até 2044, totalizando 75% da população adulta.
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