O Ministério Público do Trabalho (MPT) realizou na manhã dessa terça-feira (18/04)
uma audiência pública virtual com representantes de 65 municípios do interior de São Paulo, com o objetivo de alertar para o cumprimento da legislação que obriga os entes municipais a notificarem casos de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais no sistema SINAN, conforme previsto na Política Nacional de Saúde do Trabalhador do Sistema Único de Saúde (SUS), instituída pela Portaria do Ministério da Saúde nº 1823/12.
A iniciativa é a continuidade de uma atuação regional que busca implementar, no interior paulista, o projeto nacional da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho (CODEMAT) do MPT, intitulado “Fortalecimento da Saúde do Trabalhador”.
Os municípios que descumprem a legislação, deixando de formalizar as informações no sistema SINAN, são chamados de “silenciosos”. De acordo com a Portaria do MS nº 4/17, que consolidou o SINAN, a apresentação de dados pelos municípios é um ato compulsório, e deve ser feita por médicos, estabelecimentos e serviços de saúde (públicos e privados) e outros profissionais de saúde, em casos de suspeita ou confirmação de acidentes de trabalho, transtornos mentais relacionados ao trabalho, lesões, intoxicações químicas, doenças, etc.
A audiência do MPT, segunda sobre o tema no espaço de menos de um ano, tem como finalidade chamar novamente a atenção dos gestores públicos para tal obrigatoriedade, por meio do diálogo social. Participaram da audiência o coordenador regional da CODEMAT, procurador Silvio Beltramelli Neto, a diretora técnica de saúde do CEREST Estadual (Divisão Técnica de Vigilância Sanitária do Trabalho – DVST-CEREST), Simone Alves dos Santos, e representantes de diversos CERESTs de diferentes cidades do interior paulista.
“Fizemos uma primeira audiência pública envolvendo 129 municípios em setembro de 2022, e retomamos a ideia na campanha do ‘Abril Verde’, especificamente para tratar dos denominados ‘municípios silenciosos’, que são aqueles que não têm histórico recente de notificações no sistema SINAN, ou que apresentam um resultado muito aquém do adequado. Seguimos com os esforços de sensibilização, o que dá oportunidade aos agentes envolvidos de amplificar suas ações no combate à subnotificação e de expor o que vem sendo feito. O grande objetivo do Ministério Público do Trabalho em todo o Brasil é superar essa falta de dados minimamente convergentes com a realidade envolvendo agravos da saúde no SUS”, afirma Silvio Beltramelli.
A audiência pública dessa terça-feira reuniu representantes dos 65 municípios paulistas, dentro do espectro dos 129 participantes da audiência anterior, que possuem maior número de habitantes e uma estrutura estabelecida de atendimento à saúde do trabalhador. “Esses 65 municípios são aqueles que apresentam especificidades que nos permitem entender que a subnotificação pode ser superada pela estrutura que possuem e pelas suas circunstâncias de acidentalidade. São municípios que contam com unidades referenciais de atendimento à saúde, que são a porta de entrada dos dados encaminhados ao SINAN, ou que têm a capacidade de montar uma estrutura de saúde do trabalhador nas suas Secretarias de Saúde”, explica Beltramelli.
A DVST-CEREST/SP apresentou aos presentes o levantamento dos dados por município dos anos de 2021 e 2022, como base comparativa, demonstrando que houve pequeno incremento das notificações no SINAN entre os períodos, mas que foi “puxada” por um pequeno número de cidades.
Em 2021, dos 65 municípios participantes da audiência, apenas dois apresentaram notificações no SINAN; os demais se comportaram como “municípios silenciosos”. No ano seguinte, foram registradas 382 notificações em 29 municípios, mas 36 municípios permanecem “silenciosos” em 2022.
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Um outro parâmetro pode ser observado pelo Observatório de Saúde e Segurança do Trabalho, repositório estatístico mantido pelo MPT e pela OIT. Em 2022, no estado de São Paulo, houve grande discrepância entre os dados relativos à notificação de CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), prioritariamente feita pelas empresas (com possibilidade de emissão por órgãos públicos, como INSS e CERESTs, ou por sindicatos), e os dados de notificação de acidentes e doenças ocupacionais no sistema SINAN: neste período foram registradas 204,2 mil CAT, enquanto a formalização de acidentalidade no SINAN atingiu apenas o número de 93 mil notificações, o que ainda demonstra alto grau de subnotificação.
A coordenadora do CEREST Estadual, Simone Alves dos Santos, recomendou aos municípios que seja feita uma busca ativa de casos de acidentes de trabalho para ampliar as notificações ao SINAN, por meio da investigação epidemiológica da relação da acidentalidade com o trabalho a partir da revisão de prontuários e declarações de óbito. Segundo ela, outras fontes de informação são a mídia, a Polícia e as CAT emitidas por empresas. “Sempre que tiverem conhecimento de casos de acidentes de trabalho em outros setores, esses casos precisam ser notificados no SINAN. É muito importante estar atento às outras fontes de informação para fazer a busca de casos em relação aos óbitos e acidentes de modo geral”, explica.
Segundo alegações dos municípios, a cultura da notificação no SINAN ainda não foi implementada localmente em decorrência de dificuldades como não o recebimento de informações por parte do empregador e das unidades de saúde; a ausência de profissionais capacitados; o desconhecimento do procedimento; e até o desconhecimento da obrigação.
Plano de ação – Os municípios que apresentaram 10 ou menos notificações no sistema SINAN no ano de 2022 serão notificados pelo MPT a apresentarem um plano de ação de 6 meses para combater a subnotificação e ampliar a formalização dos casos de acidentes e doenças ocupacionais, a fim de deixarem de ser “silenciosos”. Os planos devem conter objetivos, metas e instrumentos de mensuração.
“Estamos em um momento de transição entre a sensibilização e o diálogo, para a caracterização e apuração individualizada da situação de municípios que não tenham adotado ações efetivas. Ou seja, nos casos em que houver leniência em relação ao que o MPT está pedindo, esse acompanhamento pode se transformar em uma investigação, pois há obrigação jurídica que esses dados sejam fornecidos”, esclarece Beltramelli.
Atuação – A atuação da CODEMAT na 15ª Região – área geográfica que abrange 599 municípios do interior e litoral norte do estado de São Paulo, no sentido de cumprir as metas estabelecidas nacionalmente em dois projetos, teve início em abril de 2022.
Os procuradores já se reuniram em audiências públicas com representantes de todos os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (CERESTs) do território paulista, com a finalidade de realizar uma aproximação institucional e angariar o apoio dos órgãos municipais na implementação dos projetos nacionais; com representantes de 50 empresas de grande porte com operações no interior paulista, com o objetivo de alertá-las sobre a necessidade de notificar os acidentes de trabalho e doenças ocupacionais nas formas previstas na lei, incluindo a emissão de CAT e comunicação compulsória às autoridades de Vigilância de Saúde do Trabalhador nos municípios; e por duas vezes com os chamados “municípios silenciosos”, com o objetivo de combater a subnotificação de acidentes e doenças laborais no sistema SINAN.
Até o final de 2023, o MPT espera ampliar consideravelmente o número de notificações de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais, possibilitando a criação de subsídios para o enfrentamento da acidentalidade e do adoecimento ocupacional, além de políticas públicas criadas a partir de um retrato mais fidedigno da realidade em diversas localidades do estado.
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