A Cmed (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos) publicou na última segunda (15) o valor do Fator Y, um dos componentes da equação que determina o índice de reajuste anual dos preços de medicamentos. Essa variável traduz aspectos econômicos externos ao mercado farmacêutico, como custo dos insumos no mercado em geral (energia elétrica, por exemplo) e variação cambial. Quanto maior o Fator Y, maior o percentual repassado aos consumidores.
Neste ano, de acordo com a resolução da Cmed, a variável será de 4,88%. Somando-se o Fator Y ao IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) acumulado entre março de 2020 e fevereiro de 2021, ainda a ser confirmado pelo Ministério da Economia, e subtraindo o Fator X, que traduz o ganho de produtividade da indústria e foi fixado em 3,29% para o ano de 2021, é provável que o valor máximo dos reajustes fique acima de 6% – o maior desde 2016. A publicação oficial do índice pela Cmed deve ocorrer no dia 15 de abril
Desde que a fórmula foi criada, em 2002, o Fator Y foi de 0% em quase todos os anos, com apenas duas exceções. O anúncio deste ano chamou atenção não só pelo valor, mas também por ocorrer em meio à crise de abastecimento de medicamentos usados para o enfrentamento à Covid-19.
De acordo com ofício enviado nesta semana pelo Fórum de Governadores do Nordeste ao Ministério da Saúde, pelo menos 18 estados têm estoques no limite. A mesma pressão é observada no setor privado: segundo levantamento do SindHosp (Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo), alguns medicamentos usados na UTI tiveram aumento de até 900%, como é o caso do rocurônio, um relaxante muscular usado facilitar a intubação e a respiração artificial.
Além de impactar as grandes compras públicas e privadas, o aumento no preço dos medicamentos pode ter um efeito nefasto no orçamento das famílias – já pressionadas pela crise econômica e por outros gastos de saúde. Para o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), é muito provável, inclusive, que os aumentos sentidos pelos consumidores sejam percentualmente mais altos que o valor a ser anunciado pela Cmed, já que há uma distância entre os preços estipulados pelo órgão e os valores praticados na farmácia.
“A tabela da Cmed é uma ficção porque o preço estabelecido logo na chegada de um novo produto farmacêutico ao país é, na maior parte das vezes, artificialmente alto. Na prática, isso significa que o preço que pagamos na farmácia depende dos supostos descontos aplicados pelas empresas – e isso faz com que os valores possam variar duas, três ou quatro vezes e, ainda assim, estar dentro dos limites da regulação”, explica Ana Carolina Navarrete, coordenadora do Programa de Saúde do Idec.
Para ela, cada reajuste anual anunciado pela Cmed coloca em evidência a urgência de aperfeiçoar a regulação atual. Além das falhas na atribuição dos preços-teto, outro problema apontado pelo Instituto é a proibição aos reajustes negativos – o que significa que, mesmo que o mercado esteja desacelerado ou o país atravesse uma crise sanitária, como é o caso atualmente, os preços sempre vão subir.
“O que vemos é que as distorções que começam com a definição dos preços de entrada apenas aumentam com o passar dos anos, colocando os consumidores – e principalmente aqueles que dependem de tratamentos contínuos – em uma situação muito desfavorável”, completa Navarrete.
O Senado analisa um projeto de lei que pode alterar as regras para a definição dos preços de medicamentos no Brasil. O PL 5591/2020, de autoria do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), prevê entre outras coisas a possibilidade de reajustar os valores para baixo e coloca novos requisitos de transparência para a indústria farmacêutica com o objetivo de garantir preços-teto mais justos.
No início de março, o Idec lançou a campanha Remédio a Preço Justo para apoiar a aprovação da proposta. Para saber mais, acesse o site da campanha: www.remedioaprecojusto.org.br.