Com o crescimento exponencial das redes sociais e a influência digital cada vez maior, uma questão preocupante emergiu: até que ponto influenciadores e plataformas digitais podem ser responsabilizados por promover apostas ilegais e comportamentos de risco? O debate não é apenas jurídico, mas também social e ético, já que essas práticas afetam consumidores vulneráveis, muitos dos quais são jovens expostos a um universo digital sem a devida orientação sobre os perigos dos jogos de azar.
Nos últimos anos, a popularidade das apostas online tem crescido de forma avassaladora. Impulsionada pela facilidade de acesso e pela promoção ostensiva em redes sociais por celebridades e influenciadores digitais, essa prática levanta diversas questões legais. Muitas vezes, os influenciadores focam nos “benefícios” das apostas, mostrando grandes ganhos, enquanto ocultam as altas chances de perdas, criando uma falsa sensação de segurança para seus seguidores.
Um exemplo recente é o caso do cantor Gusttavo Lima, que foi indiciado por envolvimento em esquemas de lavagem de dinheiro e organização criminosa relacionados à promoção de jogos de azar. Lima teria usado sua grande base de seguidores para promover plataformas de apostas ilegais, o que acendeu o alerta sobre a responsabilidade de influenciadores no envolvimento com esse tipo de atividade. Além dele, outros influenciadores também enfrentam problemas com a Justiça.
Deolane Bezerra, uma das influenciadoras mais conhecidas no Brasil, chegou a ser presa durante uma operação que investigava sua relação com a promoção de apostas ilegais. Ela promovia plataformas de apostas sem a devida transparência, levando seus milhões de seguidores a acreditar que os jogos oferecem grandes oportunidades de lucro. Outros influenciadores, como Wesley Safadão e Tirullipa, também foram citados em investigações sobre a promoção de sites de apostas que operam de forma irregular no país.
A Falsa Ilusão dos Ganhos
Uma prática comum entre esses influenciadores é a divulgação de grandes vitórias e ganhos nas plataformas de apostas, sem mencionar os riscos e as chances muito maiores de perdas. Essa abordagem cria uma falsa sensação de segurança entre seus seguidores, muitos dos quais são jovens vulneráveis e inexperientes com jogos de azar. Eles veem apenas os exemplos positivos, ignorando que, para cada pessoa que ganha, há inúmeras outras que perdem grandes somas de dinheiro.
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Essa divulgação seletiva pode ser considerada publicidade enganosa, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC). O CDC proíbe a omissão de informações importantes que induzam o consumidor ao erro. “A ocultação de informações relevantes, como as chances reais de perda, configura uma violação dos direitos do consumidor, especialmente daqueles que são vulneráveis, como adolescentes e jovens”, explica o Dr. Robert Beserra. Os influenciadores que promovem apostas dessa forma podem enfrentar sanções legais, incluindo multas e até mesmo a proibição de realizar determinadas atividades de divulgação.
Restituição de Valores: Critérios e Obstáculos
A questão da restituição de valores perdidos em esquemas de apostas ilegais é complexa. No Brasil, a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei nº 9.613/1998) estabelece a possibilidade de confisco e devolução de valores obtidos de forma ilícita. Porém, é essencial que haja comprovação da má-fé dos operadores e uma conexão clara entre a atividade criminosa e os prejuízos sofridos pelos jogadores. Essa relação nem sempre é fácil de provar, uma vez que muitos jogadores participam dessas atividades voluntariamente, mesmo sem total consciência dos riscos.
Aqueles que promovem ou participam de esquemas de apostas ilegais estão sujeitos a uma gama de penalidades, que vão desde a prisão simples, conforme previsto pela Lei de Contravenções Penais, até a reclusão, em casos que envolvem crimes mais graves, como lavagem de dinheiro e associação criminosa. Além das penas privativas de liberdade, há também a possibilidade de multas e o ressarcimento coletivo das vítimas. “Além das penas de reclusão, é possível que haja determinação de ressarcimento coletivo das vítimas, caso seja comprovado que um grande número de jogadores foi prejudicado”, explica Dr. Robert Beserra.
Responsabilidade das Plataformas Digitais
O papel das plataformas digitais na promoção de conteúdos ilegais também tem sido amplamente debatido. Segundo o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), plataformas como Facebook, Instagram e YouTube têm o dever de remover conteúdos ilegais mediante notificação judicial. A não remoção pode levar à responsabilização civil dessas empresas, principalmente quando se constata que esses conteúdos facilitam atividades criminosas, como as apostas ilegais. Além disso, influenciadores, como Gusttavo Lima e Deolane Bezerra, que promovem esquemas de apostas sem a devida transparência, podem ser investigados como cúmplices ou facilitadores, aumentando ainda mais a pressão sobre as redes sociais para fiscalizar esse tipo de conteúdo.
Publicidade Enganosa, influencers e Proteção ao Consumidor
A prática de influenciadores que mostram apenas vitórias em apostas, ocultando os riscos, está no centro do debate sobre publicidade enganosa. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê punições para quem induz o consumidor ao erro, especialmente ao omitir informações essenciais sobre os riscos envolvidos. “A legislação brasileira é clara quanto à proteção do consumidor vulnerável, e a ocultação de informações relevantes sobre apostas pode resultar em sérias consequências jurídicas para influenciadores e plataformas que não forem transparentes com seus seguidores”, reforça Beserra.
Além disso, a prática de apostas pode causar dependência, um problema amplamente reconhecido por especialistas em saúde mental. A exposição frequente a esse tipo de conteúdo, sem informações adequadas sobre os riscos envolvidos, pode levar a um aumento significativo nos casos de dependência de jogos de azar, o que torna a divulgação responsável por parte dos influenciadores ainda mais crítica.
Contexto Internacional e Regulamentação
No cenário internacional, muitos países enfrentam desafios semelhantes com relação às apostas online. Em países como o Reino Unido, por exemplo, há regulamentações mais rígidas para a publicidade de jogos de azar, com proibições de anúncios que possam ser direcionados a menores de idade ou que promovam a ilusão de enriquecimento fácil. No Brasil, apesar de as apostas esportivas estarem em processo de regulamentação, ainda há um vácuo legal em relação à fiscalização das apostas online, principalmente aquelas promovidas em redes sociais.
A expansão das apostas online e a influência digital trazem à tona questões legais que envolvem não apenas operadores de jogos ilegais, mas também influenciadores e plataformas digitais. O crescimento dessa indústria exige uma regulamentação mais clara e rigorosa para proteger os consumidores e responsabilizar aqueles que promovem comportamentos de risco. Para o futuro, é provável que vejamos um aumento na pressão por uma regulamentação mais robusta e transparente para as apostas, tanto no Brasil quanto globalmente, visando coibir práticas abusivas e garantir a proteção dos consumidores.
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