A Mercedes-Benz do Brasil Ltda. foi condenada pela segunda instância da Justiça do Trabalho ao pagamento de indenização no valor de R$ 40 milhões a título de dano moral coletivo, por discriminar e assediar moralmente trabalhadores lesionados da fábrica da empresa em Campinas (SP).

 

A decisão foi proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) em uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). Cabe recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

 

Além do pagamento da indenização, os desembargadores determinaram o cumprimento de todas as obrigações pleiteadas pelo MPT (fazer e não fazer), sob pena de multa de R$ 100 mil por trabalhador vítima de assédio ou discriminação, ou multa diária de R$ 10 mil, a depender do item descumprido.

 

São mais de 12 obrigações que devem ser cumpridas pela montadora, incluindo o fim das práticas de assédio moral, especialmente contra os trabalhadores reabilitados; a elaboração de programas internos de prevenção ao assédio e discriminação (diagnóstico do ambiente de trabalho, adoção de estratégias de intervenção, treinamentos, palestras, etc); instituição de processos de mediação e acompanhamento da conduta dos assediadores; implementação de normas de conduta e de uma ouvidoria interna para tratar os casos de assédio, dentre outras.

 

Inquérito – O MPT investigou a Mercedes-Benz a partir de denúncia do Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas e Região de que trabalhadores que sofreram lesões em decorrência do trabalho estavam sendo isolados dentro da fábrica da empresa em Campinas (SP) durante o seu processo de reabilitação após afastamento pelo INSS.

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Em depoimentos de trabalhadores concedidos à Procuradoria, ficou claro que a empresa não possui um programa específico de realocação de mão de obra reabilitada, fazendo com que os trabalhadores adoecidos fiquem expostos constantemente a situações vexatórias e humilhantes.

 

Uma dessas situações se refere ao isolamento desses trabalhadores em setores onde ficaram submetidos a uma inatividade forçada, ou seja, permaneceram durante toda a jornada de trabalho sem executar qualquer tipo de atividade. Além disso, os reabilitados são impedidos de participar de eventos com a presença dos demais empregados e deixam de concorrer a cargos mais elevados dentro da empresa.

 

Humilhação – Segundo os depoimentos, a situação em questão gerava atritos com os demais colegas e com as chefias imediatas, que os chamavam de “vagabundos”, “preguiçosos” e “ruins de serviço”. Um dos empregados, que possui lesão na coluna, informou ao MPT que, devido às medicações e às restrições na prática de exercícios físicos, ganhou peso ao longo do tempo. Os próprios profissionais do departamento médico da empresa afirmaram que ele havia contraído a lesão na coluna por ser “gordo” e “barrigudo”.

 

Um dos trabalhadores reabilitados foi isolado dos demais trabalhadores, segundo ele, por ser muito “articulado”. Os colegas de trabalho foram proibidos pela chefia de interagir com ele, para que não fossem “contaminados”.

 

De acordo com a acusação do MPT, os encarregados da Mercedes colocaram um grupo de trabalhadores lesionados no meio do setor de produção, entre os demais trabalhadores, e os fazia abrir caixas de papelão, com a finalidade de humilhá-los.

 

Em outras graves situações, um dos chefes do trabalhador lesionado teria afirmado que gostaria de acertá-lo com uma “12” (arma de fogo), e um outro metalúrgico, portador de diabetes, chegou a urinar nas calças porque foi impedido pelo chefe de ir ao banheiro; seu apelido passou a ser “mijão”.

 

Também foram relatados nos autos casos de discriminação racial. Um dos gerentes da fábrica disse a um dos trabalhadores reabilitados, de raça negra, que não conseguiria ir para os Estados Unidos por conta da cor da sua pele. Um outro empregado foi chamado de “macaco filho da p***” pelo chefe após denunciar ao setor de compliance da empresa os casos de assédio moral contra reabilitados.

Mercedes-Benz é condenada em R$ 40 milhões por discriminar trabalhadores lesionados

Ação judicial – A Mercedes-Benz negou que estivesse

cometendo assédio moral ou discriminação, e se negou a celebrar termo de ajuste de conduta (TAC) com o MPT. A procuradora Luana Duarte, então, ajuizou a ação civil.

Em dezembro de 2023, o juízo da 12ª Vara do Trabalho de Campinas julgou improcedentes os pedidos formulados pelo MPT, levando ao ingresso de recurso pela Instituição. O processo está sendo acompanhado pelo procurador Marcel Bianchini Trentin.

 

No acórdão que reforma a sentença de primeira instância, o desembargador relator Luís Henrique Rafael afirmou que “o Ministério Público do Trabalho descreve a identificação de linha cronológica do tratamento dispensado aos trabalhadores adoecidos a partir dos depoimentos testemunhais: num primeiro plano, os trabalhadores são vítimas de isolamento, até mesmo físico, sendo subtraídos de oportunidades de ascensão profissional, de acréscimos remuneratórios, de promoções, ficando alocados num “Grupo de Divergentes”, “congelados” dentro da estrutura organizacional da empresa”.

 

O magistrado continua seu voto, alegando que “verifica-se no comportamento reiterado da recorrida e seus prepostos verdadeiro culto ao “capacitismo”, pretendendo estabelecer quais são os corpos adequados e suas possibilidades, assim como quais não são. Ressalta-se que referidas práticas revelam, inclusive, conduta tipificada no Art. 88 da Lei nº 13.146/2015, que reconhece como crime a discriminação em razão da deficiência. Aceitar as práticas incontroversamente realizadas como “fatos isolados”, como defende a recorrida, representaria grave retrocesso social que obstaculizaria as garantias constitucionais aos direitos da pessoa com deficiência”.

 

Processo nº 0010910-78.2019.5.15.0131

 

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